Luis Mateus

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⁠Penitência e mudez

Tenho andado esmaecido, às voltas e voltas
Como quem deita fora circunferências perfeitas
E de tanto girar, embranquecido me tornei.
Se não te encontrares, procura-me,
Se o acaso deixar
E se quiseres.

Dar-te-ei
Sangue e fogo,
A veias frias que tenhas cansadas;
O céu e asas,
A penas que tenhas inacabadas;
Rios e mares de noites estreladas,
E todas as estrelas que vires,
Serão tuas,
Se quiseres.

Apressa-te!
Tenho só os anos que me faltam viver.
Os outros,
Foram apenas preparo para te alcançar.
Enfim,
Nos resquícios dos meus sonhos,
Como ainda dormes, afago-te o sono
Enquanto, da seiva que me resta,
Vou banindo folhas débeis do outono
E até lá, serei penitência e mudez
E talvez,
Os restantes poemas de amor
Sejam todos para ti,
Se quiseres.

Inserida por luismateus

Amor Intemporal

Amor verdadeiro é intemporal.
É perdão, zelo e admiração!
É juntos, adoçar quilos de sal,
Porque a vida não é doce.

É o “para sempre”
Ser uma tela apenas
De histórias pintadas e plenas
De comunhão e liberdade pura
Que não se esquece, perdura.

Se árvores tiverem raízes,
De tal maneira entrelaçadas,
Que não hajam cicatrizes
De ventanias sopradas;
Se sorrisos conseguirem falar,
Se olhares puderem ler
Como o cego vê sem olhar
Sem uma palavra dizer...
Ele, o amor verdadeiro,
Tê-lo-ás encontrado!
Impossível esquecer!

Conseguir apagar tais pinturas
Era esquecer o verbo amar:
Gestos únicos, sorrisos, ternuras,
Abraços que fizeram acalmar,
Preocupações genuínas e puras,
Uniões de corpos difíceis de largar
Em telas que foram só para ti!
Não é possível, nunca vi!

Não se esquece o amor intemporal.
Aprendes sem ele, a estar só.
Podes até sentir poesia conjugal
Quem sabe até dar outro nó...
Mas aquele raro vinho,
O que bebes uma vez na vida,
Ficará, quer queiras ou não,
Na melhor prateleira do coração.

Amor verdadeiro é imune ao tempo.
Intemporal por isso...

Inserida por luismateus

⁠Namoradeiras a valer

Abri a namoradeiras passadas,
Janelas de candura e ousadia,
Mas as vigentes namoradas
Melhor seduzem a poesia!

Tenho enredos num armário
Embalsamados e esquecidos
De tais esculturas num diário
De reais versos e vividos!

Da minha herética janela,
Tenho de ser cautela!

Não vá quem não deve, perceber,
Que o pasto dado, que desminto,
É de quem, do que foi a valer,
Está constantemente faminto.

Inserida por luismateus

⁠Poetizando...

A chuva chora,
O vento assobia
À noite e à hora
Que um luar sorria
Ao poeta que namora
Uma fingida poesia.
Porém,
Se o negro acontece
E a claridade não vem,
A tinta implode, esmorece
E o poeta também!
Ou então,
Ele não acompanha
O que o pensar debita,
E o poeta estranha
Tão generosa escrita!

Ó poeta,
Bebe, fuma e come
Desamores e dilemas,
Cafeína, cigarros e poemas,
Senão morres à fome!

Inserida por luismateus

⁠Sete plantas do meu canteiro.

Quem não ama o verbo plantar
E não vê plantas a poder amar,
É porque é louco ou nunca amou!
Amar plantas não é coisa de doidos
E doido é coisa que eu não sou!

A todas dei nome.

(... Caetana...)
Era perfeita! Em bruto, um diamante!
Mil jurados lhe bateram palmas de pé!
Só que o problema do “para sempre”
É ser coisa, que nunca o é.

(... Surya ...)
Olha-me, como se, em câmara lenta,
Pudesse com tal dócil e forte vontade
Dizer ao tempo: “aguenta, aguenta!”
Para um dia sermos unos, eternidade!

(... Laura ...)
Não há espigões, nós ou embaraços
Que mais amei e alguns lhe dei,
Porque outrora dos meus braços,
Foste errónea planta que plantei.

(... Débora ...)
De talo estranho e folhas doentes,
Busca-me chorosa, de hora a hora,
Como quem perde coisas frequentes
E depois de ser ralhada, chora!

(... Pilar ...)
Doce governanta a tempo inteiro,
Do cuidar e cantarolar certeiro
E talvez pela sua posição
Namoro-a um dia sim, e três não!

(... Renata ...)
De fraco porte, altiva e risonha,
Com um olhar seleto a vir de cima,
Como se não houvesse melhor rima
Que a minha poesia componha!

(... Leonor ...)
Verte um tal odor no meu canteiro,
Como se tudo fosse nada e ela veludo
Que supera todas as plantas no cheiro,
Querer, saber, beleza e talvez em tudo!

Rego-as amiúde, uma a uma,
Com o amor que pude e tenho,
Porque me dou a todas e a nenhuma
Dou o meu coração frio e estranho!

Inserida por luismateus

Naveguei demais...

Sei de uma pessoa
E essa pessoa sou eu,
Que em mares de lágrimas, vezes demais se perdeu.
Foram demais os desembarcadouros e cais
Onde pouco me dei e amei
E nos quais
Morri vezes demais!
E antes que morra de vez
A matar a sede em água salgada,
Queria um mar de rosas, não de estupidez!

Eu sou o mar, marujo de vocação e sem medos tais,
Que embarquei em começos e finais
Demais...
Cheirei maresias, mágoas e horas incertas,
Estive sempre aos meios-dias em praias opostas e múltiplas costas,
Sempre vazias...
Vacilei demais, remei demais, subtraí-me.
Fui, da minha conta, de menos e demais.
Naveguei muito além dela...
Perdoei tempestades e temporais,
Ignorei faróis, piratas, intuições e punhais,
Sempre demais...
Naveguei mares, rios, riachos e até lagunas.
Algumas foram lições, outras alunas
Demais...
Porque o mar não têm terra, só imensidão e gaivotas no ar,
Porque o rio lá vai como a lua, devagar
E o mar...
O mar é revolto, tem um cabo bojador e frio
E margens do rio
São fáceis de ancorar...

Acreditei
Que não havia peso no verbo acreditar
E que podia haver terra no mar!
Deve ser esta a minha sina,
Carregar coisas pesadas e lamber águas salgadas...
Tantas gotas no oceano e nenhuma é doce!
Ó mar salgado, porque não vieste adoçado?
Só que água doce
Não é o mar que a traz...

Em que luares voam passarinhos?
Em que rios estão ninhos a crescer?
Em qual das luas acreditar?
Na do céu ou na do mar?

Por isso te peço amor:
Não me vás além mar, equivocada, tentar encontrar!
E se mesmo assim, teimosa, me achares,
Devolve-me...

Porque me havia de calhar
Tão grande mar pra navegar?
E salgado ainda por cima...

Inserida por luismateus

⁠Morrer em vida...

Tu e eu tínhamos um sonho!
Encontrar um lugar
Onde nos pudéssemos esconder e amar
Porque fomos feitos um para o outro
Como a noite para o escorpião!
Mas dizem astros que não!
Que não haverá aqui ou acolá
Nem um qualquer lugar...

Morrer castigado em vida ou viver errado,
Qual o maior fardo?
Palavras tuas que apedrejei e devolvi ao vento,
Maltratei borboletas que nasceram de nós,
Fiz da flor dada, uma lembrança e da recebida, uma bola de trapos...
Estou cansado de me cansar,
Do pesar da consciência pesada,
Dos porquês de um dia teres sido a mais incompreendida e a mais amada!
Cansado...
De ser floresta vazia de raízes e oxigénio,
De te procurar, porque estás em toda a parte e em parte nenhuma!
De não ouvir um sopro teu, nem ventos de mudança...
Pudesse eu voltar atrás
E não me poria na prateleira das coisas mortas e obsoletas...
Perdoa-me o que não disse, fiz ou não dei e o pouco que amei
Como eu te perdôo o mal que me fazes...
Vertem-se-me lágrimas que não caem ao chão,
Ficam todas presas nos porquês de não te poder ter
Porque também em vida se pode morrer!
Sonhava um casamento de almas em que nos imaginava
num equilíbrio que selava ambas as polaridades...
...a tua e a minha!
E tu estás tão linda...
Ainda te amo...
Ainda te choro e de vez em quando, ainda te soluço...
E sempre te amarei...
Ainda, tanta coisa...
Ainda tanto por doer e dizer...
Ainda me dóis onde a dor mais dói...
Ainda me perco nos teus olhos castanhos...
São relativos e estranhos!
Quando me olham, sérios e perguntadores, não dizem nada!
Convidam-me apenas a pedalar no lodo, sem pedais
E obrigam-me a fumar cada vez mais!
Oxalá me chamassem às fogueiras dos lençóis da tua cama,
Onde faríamos amor todos os dias...
Queria amar-te de mil maneiras e mais algumas que não esperasses,
Queria que tivéssemos sido liberdade, glória e cumplicidade...

Tenho saudades...
Do teu sorriso, do teu olhar inclinado a namorar o meu,
Das prosas de Julieta e Romeu
Que me deixaram refém
De “amo-tes” que diziamos e dos não ditos também...
Saudades...
De andar de mão dada
Numa qualquer rua, esquina ou calçada...
Dos nossos rebentos...
Os que tivemos e ainda vejo
A precisar de um beijo e tantos lhe demos!

O amor,
Se ele me sorrisse,
Eu lá estaria para o receber e matar
O que o matou um dia...
Morrer em vida são pés no chão a cair por um telhado
Que estava certo de amor,
Mas errado, sem alicerces...

A morte,
A que me foi redigida
Por um defensor dado à sorte,
Nem proferida foi ou acusação teve,
Nem fraca, nem forte!
Seria hoje morto em vida
Se me dissesses um “amo-te” aqui e agora, daqueles intemporais e sentidos.
Depois nada. Lágrimas falariam por mim.
Talvez o corpo tremesse por dentro e eu sorrisse por fora
Antes de morrer...

Está escrito nas linhas das mãos, nos corações
Que será noutro amanhã, noutro lugar
Quem sabe em Marte, num qualquer ano
Porque o meu amor é marciano,
Talvez verde e com antenas,
Como eu, maturado...
Apenas...

Se um dia te vir por aí de mãos dadas,
Que seja ao menos o teu conto de fadas,
Porque o lugar que deixastes era o meu.
Até depois...
Uma flor com um “Amo-te” lá dentro...
Toma. É para ti.

Inserida por luismateus

Flores

Uma Gardénia sincera pintei, inocentemente de branca!
Flor que a todos enleva, qual Florbela que me Espanca!
Fita-me depois uma Margarida pequenina e inocente,
Ali e acolá, às escondidas da Gardénia e de toda a gente...
Uma Gerbera baloiça alegre e sem saber de nada
É engolida por uma voraz Papoila encantada!
Bela flor, a Irmã do Nenúfar em água mergulhado!
Plantei juntas, estas duas irmãs do meu agrado!
Violeta e Alfazema no meu jardim vieram encontrar
Uma Rosa que queria, num poema ser plantada!
Mas nenhuma das três a viu acabada. A poesia!
Foi de dia, que uma Flor de Laranjeira me deu
Uma honra nua, que na minha lembrança e na sua
Para sempre ficará!
Flores perfeitas, onde as há?
Talvez na Índia ache Orquídeas Rainhas!
Alguém as quer suas, mas eu quero-as minhas!
Veste o Jacinto tatuado, um “Sari” encarnado...
Raro vinho tinto que não passou do noivado!
Um postal me deixaram, em jeito de recado...
Um Lírio sedutor e uma Flor de Lis que me calha...
Jogado à minha sorte, bebo no campo de batalha
Tudo o que há pra pecar: suor, luxúria e pecado!
A Coroa Imperial. Do alto da sua sedutora luz e poder,
Rompe a rombos de machado o porte régio do meu ser!
Fico amansado! Mas a Acácia amarela depois me seduz!
Creio ter espinhos e dor! E tem! Creio ser uma cruz!
Se Deus há no Céu… Ele finalmente me prendou...
Cravo branco, amor ardente, mãe de todas as ofertas,
Inexplicável flor, porque todas as outras desconcertas?
Jasmins e Gladíolos com pétalas a esvoaçar,
Prímulas e Cactos que me querem dar a mão!
Antes partir que vergar, a flores que não o são!
Mas que raio...
Uma flor, numa Flor de Lótus sentada está!
É o que esperava? Será?
Por minha culpa, não!
Antes espinhos virão!
Sai da minha sombra Petúnia! Procura a tua luz!
Sal, azedume e dolo, não são o que me seduz!
Cravo Amarelo, cantas bem mas não me contentas!
Cheirei as cores da tua alma e eram todas cinzentas!
O Açafrão e a Azálea Branca das querelas e traições,
Dos saltos pelas janelas e dos arfares dos pulmões
São como a Rosa Lilás! Não me dizem nada!
A professora Camélia, de grandes pétalas e atraente,
Não se deixou regar! Não era pró meu fino dente!
Aconteceu assim este fado…
Talvez o meu jardim não estivesse bem regado!
Adelfas e Magnólias me aquecem como as aqueço,
De dia, vestem-se às direitas, de noite do avesso!
Pergunto porém
À Tulipa Amarela, que sonhos tens acordados?
Malas comigo feitas ou desfeitas aos bocados?
Giesta, flor que dá calor ao espinho que colhi…
Fiel livro que li! Flor que não partiu. Floriu!
Sorri a Dálias, Cardos e Flores do Campo
Antes de perguntar:
Malmequer ou bem-me-quer, o que queres semear?
Regar tais flores é como ter navio e não ter mar!
Às Begónias colhidas, que me foram dadas,
Angústias e uma flor dei, às flores rejeitadas…
Morreram todas...

Inserida por luismateus

⁠E lá tudo era perfeito…

Lá, ninguém era cego ou mau olhado
Porque eram todos Reis do Reinado;
Não havia roubos ou ladrões,
Nem corretivos ou cem perdões;
Eram amigas, a pressa e a perfeição;
Quem caçava com gato, tinha cão;
Havia galhos para todos os macacos
E promessas não caiam em sacos;
Águas nunca vinham em bicos,
Os espertos não eram Chicos
E todo o pecado era omisso!
O feiticeiro era amigo do feitiço
E este não se virava a ninguém;
Não havia mentiras a beijar bem,
Todas socavam com verdades;
Casas não tinham portas e grades
Pois não haviam almas gulosas.
Lá dentro havia um mar de rosas
Na carta fechada do casamento
Porque todo o mar era bento.
As rosas não tinham espinhos
E gaviões não seduziam ninhos.
As cercas não eram puladas
Nem por bruxas nem por fadas;
Maridos diabos eram santos;
Não havia querelas pelos cantos;
Judas era coisa que não havia
Nem sequer no dicionário;
O vinho não batia nas cabeças
E a culpa casava-se sempre
Quanto mais não seja
Com o confessionário!

Inserida por luismateus

⁠A tua caligrafia...

A tua caligrafia é imaculada como as pedras do rio.
A tua letra engomada, como a vaidade de quem a nada se curva.
Letras tuas assim dispostas, em falares e perguntas,
Espalhadas pelas encostas de parágrafos que juntas,
Não param de me cantar!
Andas perdida de mim, como o sapato da Cinderela!
A minha espera já vai alta,
Como a escuridão dos corpos celestes mais distantes do universo.
E depois os Deuses,
Dão-me a luz do dia: a tua caligrafia!
Ela declama pra mim só nos solstícios de Verão!
Esses dias são quentes e longos! Mas são poucos!
Como poucos são os meus sorrisos, que são às direitas como a tua letra!
Mas afinal o que escondem as montras da tua caligrafia?
Amor ou agonia?
O que pensarão os teus olhos nos dias em que te escrevo?
Os meus já pesam, de querer um pequeno casebre que nos bastava!
Tudo o resto, se não viesse, eram amendoins para dar aos macacos apenas...
Vezes sem conta passo-te a pente fino,
Como o amor que fazemos sem tu saberes!
Sou eu que o imagino.
O amor e o cheiro dos teus comeres.
Cheiras-me a cinco filhos e um lar.
Uma casa onde o amor se cante
E onde nos vejo a governar:
Tu princesa, eu infante
E os miúdos nos afazeres de criança!
Queria dar-te o universo de bandeja
Mas ao menos receber uma esperança que se veja!
Depois de te ler, abre-se-me um vazio
Por onde a tristeza cai à terra, como um dominó que tomba todas as palavras que li...
Depois, meto-as na gavetas das coisas que me metem medo
E pergunto-me em segredo e lavado em choro:
Quando será paga a última prestação deste namoro?

Inserida por luismateus

⁠Marido itinerante

Tenho mil caras nas algibeiras
Que trouxe de mil países!
Por lá, vi favos em figueiras
Onde cometi mil deslizes
Porque o mel dos figos
Estava perto dos umbigos!

Não há coração que eu plante,
Nem flor que em mim floresça
Porque sou marido itinerante,
Sem remorso que me cresça!

Oh senhores! A minha culpa,
Que já não se sente culpada,
Não sabe se trair é desculpa
Ou se a esposa não é amada!

Inserida por luismateus

⁠Gotas de orvalho...

Raiar do dia sem sol ou orvalho
É como paixão caída por terra,
Que depois de solta do galho,
É manhã que o amor encerra!

Se gotas de orvalho são vãs
Em raiares do dia que tens tido,
É porque caem nas manhãs
Às quais nada tens oferecido!

Orvalho, que gorado estás,
Matuta nas escolhas feitas,
Se puxam gotas pra trás
Ou se caem às direitas!

Orvalho que à pétala não dá
Nem uma gotícula de amor
É como rosa onde não há
Espinho que cause dor!

Por folhas, galhos e intrigas,
Por onde cai a tua mágoa,
Gota de orvalho, não digas:
“Nunca beberei desta água!”

Terra ardida, sem cor
Colorida por orvalho
Faz renascer a flor,
Faz do fogo, borralho!

Inserida por luismateus

⁠De procurar-te, ando perdido!

De procurar-te, ando perdido,
De perdido, ando cansado
De a toda a hora ser traído
Pelo que tenho procurado!

Fará sentido ou é inglório,
Pedir o que tenho pedido
E esperar que o peditório
Não vá por onde tem ido?

Mas se for, alguém me dê
Um alqueire de coragem
Pra pedir como quem vê
No deserto uma miragem!

Inserida por luismateus

⁠Bolha de sabão

Ó bolha de sabão
Que levada foste pelo ar,
Em ti voa um coração
Que não sabe amar!

Procuro luz às escuras,
O que quero e não tenho:
Arestas das minhas curas
Limadas ao meu tamanho!

O vento que atraiçoa
Tão abatida e vã espera
Faz-me ser fria pessoa,
Ser quem não era!

Já não tenho restos
De força nas algibeiras,
P’ra entoar protestos
A esperas solteiras!

Ó bolha de sabão
Que não paras de voar,
Que posso fazer senão
Contra o vento, remar?

Luis Mateus

Inserida por luismateus

⁠Sereias apaixonadas!

Já velejei os quatro pontos cardeais à procura de um porto seguro
Daqueles que fazem amor impuro em todos os desembarcadouros e cais
Ou dos que nos querem, mesmo salgados, tempestuosos e despenteados!
Ó vento que me despenteias...
Tanto me sopras a horas em que todas as sereias estão encalhadas
Como nos dias em que tenho a sorte já prometida!
Velejo pelas marés da vida onde sopram nortadas de ventos que beijam bem.
Não são sereias beijoqueiras, são casamenteiras delas próprias!
Oxalá não fossem comigo, essas perdas de tempo!
Mas são!
São pingos de sal que queria ser doce!
São pele e escamas que vertem lágrimas
E que me querem prendar com ouros, finas porcelanas e caxemira.
Outras,
São rajadas de ventos frios, que perseguem marujos peregrinos e fugidios!
Mas quais são afinal, as rotas das sereias que não se apaixonam?
Todo este sal, é doce fazedor de poesia!
É vento que me faz vasculhar palavras e rimas dentro do mar salgado
Onde lambo sílabas e versos
P’ra lhes retirar o sal...

⁠Rum caseiro!

Entrego-te nas mãos o meu jejum, enquanto despojo o teu.
E sem pudor algum, unos, viramos lobo e fingido cordeiro!
Bebo um vaso por inteiro e de seguida mais um!
O terceiro como o primeiro, soube a secura e bom rum!
Por entre runs arfados, acendo mais um cigarro
P’ra dar folga ao que não sei
Ser banal ou bizarro!
Trocamos de nomes, uns nobres, outros reles;
Fundem-se prosas, taras e peles;
Oh minha Deusa, dói-me tudo de te beber;
Tenho a boca seca de te saber de cor;
Os braços gritam queixosos, de te abrir o ventre a rombos de machado!
Bendito o néctar que dá calor e nevoeiro!
Beija bem, é doce mel beijoqueiro!
Não tenho em mim, poro que não chore, nem cigarro que chegue ao fim!
Acendes-me uma fogueira que me quer cortejar,
Aquecer ou talvez amar...
Mas a chama vai fraca, assim como a força do nosso enredo
Que joguei ao lume…
Fico tonto, de tanto olhar o céu, revoado de anjos e demónios!
Uns, querem-me enviuvar, outros casar!
Pergunto aos primeiros:
De que vale amar
Se quase ninguém o sabe fazer?
Talvez a minha sina não seja essa,
Talvez seja só procurar!

Era o que havia:
Amor bastardo, um cinzeiro, lume e rum caseiro!
Bebemos tudo...
O que havia p’ra amar!

Inserida por luismateus

⁠O beijo que não te dei...

Por mais que tente
Emudecer o meu trovar,
O meu brado só sente
Vontade de te beijar!

Porque me apaixonei
Pelo que vou roubar:
O beijo que não dei.
Ah, mas vou dar!...

Inserida por luismateus

Amor verdadeiro

Amor que é amor,
Que verdadeiro é,
Para sempre será
Eterna flor cuja fé
Nunca morrerá!

Inserida por luismateus

⁠Oh Clemência!

Minha clemência acabou!
Não sei amar assim!
Não pedi mais do que dou!
Pedi flores do teu jardim
Que a tua alma beijou...

Tuas rosas traiçoeiras
Têm espinhos de cetim!
Nunca se deram por inteiras!
Nunca foram para mim!
Tuas espinhosas roseiras
Deram a flor que me enganou!
Nunca foram verdadeiras
Nunca amaram quem te amou!

Inserida por luismateus

⁠Ovelha branca...

Ovelha que pastas a meu lado…
Estou grato pelos encontrões, pelas pisadas e safanões que me destes…
Vêm de negras ovelhas
Ou de lobos traiçoeiros, disfarçados de carneiros e armados com tesouras!
Tesouras que cortam e ensinam...
São as melhores professoras, as facas e tesouras!
Cortam lã e agasalho, mas dão calo e sabedoria pra tosquiar o que escurece:
As cinzentas ou negras, as que não dão leite ao pastor nem aconchego à ovelha do lado…
E aprendi...
A dar leite como o pastor ensinou e fugir da faca que o lobo espetou...
Sou ovelha com lã de aço, cascos refinados, lábios mais calados…
Quero pastar em campos de altos muros,
Onde lobos ficam de fora, tesouras não cortam e facas não espetam...
Sou ovelha solitária…
Sangro onde as bandarilhas dos lobos toureiros espetaram...
Mas não morri, renasci...
Esperando pela ovelha branca
Para lhe apontar o melhor pasto…
Até este acabar...

Inserida por luismateus

⁠Um mundo a arder...

Sou de Marte!
Sou Marciano!
Vivo sem arte,
Num mundo aparte,
Num mundo insano
Onde ser humano
É engodo, é engano,
É ser leviano!
Pisam-se flores,
Plantam-se dores,
Matam-se amores,
Cantam-se horrores,
Namoram-se pudores
E dão-se louvores
A quem quer ver
O mundo a arder!

Inserida por luismateus

⁠Mil dores por curar

Já acumulei mil dores
De mil feridas por curar,
Tantas quantas as cores
Das que estão por fechar!
Quais as curas ou remédios,
Pra curar os mil tédios
Que me fazem escrever
Mil poemas sem querer?
Mil perdões por pedir,
Mil sorrisos por sorrir,
Mil dores por curar
E mil espinhos por aceitar
Porque sou ser sem dono,
Rei sem trono
De uma vida por viver
Sem sequer saber
Qual dos mil destinos,
Qual dos mil violinos
Hei de tocar!

Inserida por luismateus

⁠Afrodite

Um quarto fechado, que tem:
Uma Afrodite,
Um silêncio perfeito,
Um abraço quente e trancado,
Um milagre, um tesouro que aconchego e venero
Enquanto o tempo desvairado, corre, sangra e chora
A agonia que vai e vem, como o amor que fazemos.
Cheiras a poesia e orquídeas.
Sabes a rubi doce e amargo!
E quando ainda estás, sinto saudade
Da Valquíria que vai e Afrodite que fica
No meu pensamento...

Valquíria, que me dóis onde a dor mais dói...
No coração que te entreguei.
Dóis-me porque amo as duas!
E as duas és tu.

Inserida por luismateus

⁠O papelinho que te namora...

Tão certo como o amor que te darei
É a minha vontade de te rimar!
Mas rimar não sei,
Mas posso tentar!
Venho-te assim dizer
O que esconde o meu coração.
Quando estou contigo,
Horas parecem segundos
E segundos são profundos
Sonhos em que te oiço e digo:
És anjo a quem posso falar,
Rir e porque não chorar!
És ser iluminado!
Talvez verde e com antenas...
Como eu, assustado...
Apenas...
Não pensei ser ainda capaz
De falar do que o amor me faz,
De sentir o que me fazes,
De conseguir fazer as pazes
Com o sentimento de amar...
E o imponente universo,
Que uniu forças pra nos juntar,
Escreveu verso atrás de verso,
Para que possamos afagar
Este amor controverso...
Lê com carinho e atenção
Este papelinho que te namora
E se quiseres ou talvez não,
Depois...
Deita-o fora...

Inserida por luismateus

⁠Como é que se diz isto a alguém?

Diz-me com que olhos te devo falar?
Se com os que tenho,
Ou com os que t’estão a deixar?
Que poções tenho de beber?
Que marés devo navegar
P’ra que possas entender!

Palavras são pedradas!
Perguntas vazias...
Respostas não dadas…
Resvalámos, sem saber
Que a dor é deste tamanho
E não da que devia ser!
Como olhar um olhar caído?
Como pedir que sorrias,
Se sorrir não faz sentido?
Como dizer a um coração,
Que metade de ti nos une,
Mas a outra não!

Como é que se diz isto a alguém?
Como dizer o que não se diz a ninguém?
Que o fim vai começar...

Inserida por luismateus