Lúcia Fonseca

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ESTRADA

Por todas as curvas do caminho
há sempre um paraíso perdido,
um amor abortado
um podia ter sido
aberto em flores vermelhas.

Adiante o que é: áspera dormida estrada branca.

RESÍDUO

Palavras brotaram desconexas e esparsas.
Sua seiva era de lágrimas.
Incompreensível.
E rosas são as que ficaram fenecendo
em meus jardins de pasmo.
Caules se inclinam, se adelgaçam
no crescer, no confiar.
Verde-tenro se quebram, estalando leve,
choram seiva.
Navios se afastam do cais
e brechas surgem onde o corpo afunda
nutrindo vazios.

De tudo que fomos de caules,
de pequenas pedras, de penugem;
de tudo que fomos de sutil e tênue,
de troca de pólen e seiva,
de pequena ternura;
de tudo que fomos de fremir de abelhas,
de corola e aquiescência e espanto,
resta esse campo desolado na manhã
coberto de geada e assombro.

TEMPO

Vê-se a noite. Os relógios calam.
Um pêssego apodreceu no aparador.
O tempo põe manhãs nos dias, flores em cada primavera,
o que se vê é a morte.
E flores roxas como gritos,
insônias e febres.
A criança constrói de espanto balbucio e olhar,
constrói de leite pétalas internas.
Os relógios calam.
A vida nos vive, garganta aberta.
E a luz que pousa sobre a lua
vai perseguida por um véu de sombra
— caçada.
O tempo põe manhãs nos dias, flores em cada primavera.
Um pêssego apodreceu no aparador.
O que se vê é a morte. Os relógios calam.