John Scalzi
Fazer as pessoas mudarem porque você não pode lidar com quem elas são não é o caminho. O que precisa ser feito é que as pessoas parem de olhar apenas para o próprio rabo.
Me disseram que meu espaço liminar é como a escuridão de um túmulo. Mas acho que é como a escuridão da outra ponta da vida. A escuridão de tudo o que está à frente, não de tudo que ficou para trás.
Eu odeio este lugar. Odeio que a mulher que viveu comigo durante 42 anos esteja morta, que em um minuto, numa manhã de sábado, ela estivesse na cozinha misturando massa de waffle em uma tigela e me contando sobre a briga na reunião do conselho da biblioteca na noite anterior e, no minuto seguinte, estivesse no chão, contorcendo-se enquanto o derrame partia seu cérebro ao meio. Odeio o fato de suas últimas palavras terem sido: ‘Onde eu botei a porcaria da baunilha?’.
Mas, por fim, vocês devem se importar porque são velhos o bastante para saber que devem. Esse é um dos motivos pelos quais as FCD selecionam idosos para se tornarem soldados. Não é porque vocês todos estão aposentados e são um peso para a economia. É também porque vocês viveram o bastante para saber que há mais na vida do que a própria vida.
No meu aniversário de 75 anos fiz duas coisas: visitei o túmulo da minha esposa, depois entrei para o exército.
Preste atenção: quando se tem 25, 35, 45 ou até mesmo 55, ainda é possível sentir-se bem com as chances de enfrentar o mundo. Quando se tem 65 e o corpo está diante da ruína física iminente, esses ‘regimes e procedimentos médicos, cirúrgicos ou terapêuticos’ começam a parecer interessantes. Então chegamos aos 75, os amigos morrem e já trocamos ao menos um órgão principal, precisamos mijar quatro vezes durante a noite e não conseguimos subir um lance de escadas sem ficar zonzos – e dizem que estamos em muito boa forma para a idade. Trocar isso por uma década de vida nova em uma zona de combate começa a parecer um negócio e tanto.