Isabella Varalda
"Anel de namoro é brega". Eu podia ter dormido sem essa, pensei assim que li essa frase. Claro, eu não precisava estar atualizando freneticamente as redes sociais - consequência da falta de paciência com os livros que deveria estar lendo -, mas não dá pra negar que fiquei contrariada por essa frase tão imprudente.
A única coisa que pude concluir imediatamente - além de que a garota era solteira - era que ela prossivelmente tinha se machucado e estava com aquela dor de cotovelo de quando se é tirada à força de um relacionamento.
Tive vontade de dizer abertamente pra ela como é bom ter alguém pra quem correr pros braços, uma pessoa pra se contar e contar tudo o que se pensa, alguém que sabe os seus defeitos, te conhece do avesso e que ainda assim consegue te amar ao absurdo ponto de ter ciúmes de você.
Controlei o impulso de falar como ela estava equivocada em pensar assim e de expor tão descaradamente sua ideia tão imprecisa do amor. Sendo a aliança um dos grandes símbolos de amor, um sinal discreto, mas presente de quem você gosta, como poderia ser brega?
Gostaria de ter tempo para esperar e ver tal garota se apaixonar, começar a namorar, querer mostrar a todo mundo como ela é só dele e ele é só dela, mas ter que se contentar com status de relacionamento de rede social porque - infelizmente - aliança de namoro é coisa brega.
Eu diria que tudo estava bem, mas sem esquecer que ficaria mais fácil se parassem de me perguntar sobre você, ou mais ainda, se começassem a controlar os olhares de pena quando veem que eu mesma não sei responder direito o que aconteceu. Não sei, mesmo, e às vezes acredito que nem você sabe. De um dia pro outro, o seu sorriso se desfez, o seu toque pareceu menos disposto e a sua risada, mais comedida. Suas respostas vinham espaçadas, como se realmente fosse preciso muito tempo para responder perguntas tão simples quanto as que eu fazia. Entendi, eventualmente, que você evitava falar sobre a parte complicada de nós, aquela que nenhum dos dois sabia como por em palavras, ou talvez algum de nós só não tivesse interesse em ter o trabalho de explicitar. Evitava assumir como não era confiável, ou relembrar de como desistiu de mim em tempo recorde. Evitava, e só. Foi de repente. Cortou todos os laços antes que eu me desse conta, virou as costas e correu. Voou como um tiro. Partiu tão rápido que não tive tempo de colocar nossas fotos na sua mala. Porque se é para ir embora, no mínimo tivesse a decência de levar tudo, me deixar zerada, pronta pra outra. Foi triste ver como eu fiquei de olhos fechados por tanto tempo, tão iludida naquela tranquilidade querida, mas instável. E você sabia disso, mas preferiu o silêncio, o que era melhor para você. Entendo, ninguém gosta de assumir os próprios defeitos. Mas gosto das fotos porque tenho certeza que elas não vão mudar, mesmo quando as pessoas nela, vão. Pode deixar que as fotos eu guardo.
Eu ainda lembro do cheiro dos cigarros dele, como se a qualquer momento ele fosse voltar e me entorpecer, tirar todos os meus sentidos antes mesmo de encostar em mim. Lembro da tatuagem que ele tem nas costas, do videogame cheio de jogos, do sofá desconfortável, da janela sem cortinas, da pilha de filmes ao lado do dvd, do notebook e até das notas ruins que ele tirava. Também nunca esqueci da sua voz, por mais que ligações não tenham sido nosso forte, nem andar de mãos dadas, ou sair juntos todos os dias. Mas, muito mais do que qualquer detalhe ou lembrança pequena, sempre lembro do que aprendi com ele, que, por mais que duas pessoas sejam tão diferentes, enquanto for da vontade das duas, tudo pode dar certo.
Hoje, passando pela casa da minha mãe, notei que ela resolveu se livrar das tralhas. Ela vive reclamando de como minha vó guarda eletrodomésticos antigos, panelas antigas, móveis antigos e não se desfaz de nada, mas aí eu percebi que ela faz o mesmo. Não foi com espanto, não ainda, que olhei para a minha vida, pois sei que sou o oposto delas. Uau, mas do que eu estou falando? Se sou tão sã e oposta, por que com você seria diferente? Desde minha adolescência, nunca hesitei em me livrar de cadernos sem páginas em branco, esmaltes que estavam estragando, sapatos já menores que meu número, roupas velhas, porque é assim a vida, precisamos nos livrar de tudo que parou de nos fornecer benefícios e começou a ocupar espaço inútil. Foi assim que eu aprendi e pensei desde cedo. Temos que tirar o que não funciona mais pra dar lugar à coisas melhores ainda. Mas se eu sou tão diferente assim, por que eu ainda não consegui tirar você da minha vida?
Mas quer saber, liga sim. Quero atender com minha voz mais bonita e te mostrar mesmo como estou mal com a sua falta. Quero mesmo te atender e te mostrar que não perdi o ritmo, que mesmo com você falando que nossa música já tinha parado de tocar na rádio, e que só eu ainda dançava ao som dela, ainda danço muito bem, obrigada. E até canto, agora. Liga, sim, que aí vai ouvir no timbre da minha voz que quem perdeu foi você. Que não importa mais, mesmo, mas que quem não se importa sou eu. Mas liga mesmo, e aproveita pra me dizer que eu não sou nada sem você, que eu tô doida pra me ouvir dando uma risada.
Parou de machucar já tem um tempo. Você não funciona mais como a âncora que segura meus pés no chão, e eu não sou mais as asas que te levam ao céu, ou qualquer outro lugar inimaginável. Por mais que as folhas continuem a cair, até o vento parou de passar. Aqueles atalhos nem existem mais e o chão, antes tão bem cuidado, agora está cheio de ervas daninhas.
Os caminhos finalmente deixaram de ser os mesmos e eu comecei a descobrir novas experiências. Sabe que nem chover, chove mais? Parece que até as nuvens evitam passar por nós. Quem somos, ou quem éramos, já não faz tanta diferença, já não tem força pra mudar quase nada. E sozinho, a sua força é menor ainda. E sobre a dor, doeu por muito tempo, mas hoje já não machuca mais. Você não queria estar morto como eu?
Mesmo sendo tarde, continuo aqui, no meu canto, com o mesmo pensamento desde que acordei. Já passa das duas e eu ainda estou esperando alguma coisa acontecer. Alguma coisa que me diga "saia dessa cama, a vida tá te esperando aqui fora", mas o telefone continua mudo e nada se mexe por aqui. Parece que até o relógio parou. Continuo pensando sobre a mesma noite. Ensaiando dizer as mesmas palavras, todos os dias. Mas isso tá acabando comigo, porque me mostra que, por mais que eu queira, eu sempre acabo destruindo tudo que eu poderia ter, apenas por medo de perder depois e sofrer com a falta. Será que esse medo algum dia vai embora? Porque sempre que eu arrisco, eu penso que está tudo sob controle, mas no segundo seguinte estou sozinha de novo, ouvindo minha consciência "eu bem lhe avisei, trouxa". E aí, vivo de imaginar, porque aí não corro o risco de perder. Então, eu acabo entre dar um passo pra trás e evitar cair de cabeça nesse abismo. Mas até que ponto vale a pena largar a confortável solidão pela inconstância de um relacionamento?
Queria, mesmo não tendo o menor sentido, te dar os parabéns. Porque tantos já tentaram me fazer sentir vontade de arriscar de novo, mas, mesmo sem tentar, só você conseguiu me convencer. Porque minha zona de conforto sempre valeu mais pra mim do que qualquer um. Desculpa se eu ainda não tenho coragem de sair da cama, é porque eu ainda não acredito que tive essa sorte; estou feliz demais para acreditar que essa já é a realidade.
Dá vontade de largar tudo? Dá. E de desistir? Jogar tudo pro alto e nunca mais olhar pra trás? Dá, sim! Mas nem por isso a gente desiste. Porque no fundo sabemos que o melhor está a apenas um dia ou um segundo à frente. Porque não é desistir que vai nos levar lá, onde quer que o "lá" esteja. Ou com quem quer que seja. Porque, aliás, a desistência acaba com a melhor parte do processo, que é a recompensa. No fundo, sabemos que não desistimos porque lutamos demais por aquilo, e é justo que, no mínimo, alcancemos nosso objetivo. Talvez seja por isso que insistimos tanto numa mesma pessoa, num mesmo caminho, nas mesmas ações. Coisas que acabam mais machucando do que nos fazendo bem por um bom tempo. E se no fim vale a pena? Ninguém sabe. Às vezes só o tempo vai poder mostrar. E pra que perder essa chance de ser feliz? Pra que jogar tudo pro alto? Não tem sentido! A vida é assim. E não dá pra desistir. Não dá.
Na primeira vez que você me falou que não conseguiria me fazer feliz, eu até acreditei, achei que era porque não conseguiria ser feliz junto e até entendi. Mas uma mesma desculpa não cola duas vezes, e eu percebi que quem não quer ser feliz é você. Quem não quer arriscar, quem simplesmente não quer algo - pra começar - é você. Quem tá com medo de crescer é só você e eu não vou mais ficar pagando o preço dos seus erros. Enquanto você não enxerga o que quer, não sou eu que vou servir de guia pra você. Chama uma das suas garotas dessa vez, quem sabe não funciona?
Mas sabe, deve até estar aproveitando mais, assim, cheio de meninas, cheio de atenção. É essa vida vazia que você tanto gosta, mesmo. Sempre foi. Só que eu nunca vou entender a graça que você vê nela, de chegar em casa e ver que a única pessoa que te esperava até meia noite, já não está mais lá. De ver que o seu colo nem pode mais ser chamado de seu. Não posso mais ser chamada de sua. Até a mais paciente das mulheres conseguiu se cansar de você.
Quando eu estou bem, eu estou bem. Quando não lembro de você, não adianta, só vou lembrar se alguma coisa acontecer. E sempre acontece. Pode ser até uma coca cola que um cara da segunda cadeira está tomando, ao lado de uma mulher de cabelos armados, a 20 metros de mim. Se a coca cola tiver o seu nome, ele estará virado para o meu lado, e mesmo que antes eu não estivesse reparando naquele ponto, no segundo certo, eu obviamente vou vê-la. E toda minha pseudo-miopia não vai ser o suficiente pra esconder seu nome de mim. Então, vou lembrar de você. E vou me arrepender.
A minha vontade, embora você não tenha perguntado e nem se importe, é perguntar o que tem de tão errado com você. Perguntar por que você insiste em encontrar uma janela na minha vida, só depois que eu já fechei todas as portas, e porque depois que consegue entrar, dá um jeito de escapar de novo. Também ia aproveitar pra tentar saber o que eu te fiz de tão ruim pra merecer um traste desses, que, aliás, nem aceita ser tratado como tal. E ia querer saber, acima de tudo, qual é a sua? Mas acho que nem você ia saber responder metade dessas perguntas, já que você mesmo é tão zoneado por dentro que nem sabe mais como funciona a própria cabeça. A única coisa que você sabe, aliás, em que já se graduou, é me criticar, apontar todos os meus defeitos, como se você não tivesse nenhum. Mas quer saber? Você acabou sendo como todos os outros. Já foi. Fique à vontade para pensar qualquer coisa de mim, porque sendo você qualquer um, qualquer coisa já deve servir.
Eu costumava achar que me contentava com pouco. Mas não. Pensava que era feliz com metade das coisas que fariam a maioria das outras pessoas felizes. Mas errei. A metade só me faz meio feliz. E por que eu não ia querer ser feliz por completo?
Se quiser me amar, vai ter que ser por inteiro. Se quiser ir, não vai poder voltar quando bem entender. Mas, se quiser ficar, prefiro que fique pra sempre. Não é questão de extremos, ou de exageros. Eu posso até não merecer, mas eu preciso das coisas por completo. De sonhos, planos, amores, abraços, beijos e carinhos por completo. Qual a graça de viver pela metade? E de fazer um plano e não cumpri-lo? Não, não quero perder a melhor parte do processo, quero ser feliz por inteiro. Repito, não por merecer, mas por precisar.