Henrique de Paiva Resende
Às vezes, me dá a louca. Faço coisas que jamais imaginei fazer. Me arriscar em uma tempestade com um guarda-chuvas, que atrai raios, para escrever sobre as senseções que a chuva me causa, é apenas uma dessas coisas.
Não. Não mesmo.
A última coisa que eu estaria é bem.
Na verdade, a última coisa que eu estaria seria morto, mas como esse estado é tecnicamente impossível para o meu ser (ou não), prefiro dizer somente que não estou bem.
Não importa, sempre será assim.
Nós sempre teremos medo de que alguém interrompa nossos planos e acabe com nossos sonhos (os quais, inocentemente, julgávamos que seriam realizados).
Ó céu, derrame a chuva sobre o meu ser completamente despenteado nesse dia cinza de primavera.
Estamos mesmo na primavera, não é?
Como eu fui capaz de enganar a mim com essa tolice de amar?
Há pouco descobri que todas as cores que eu vivi nos últimos meses não passavam de cinza.
Não era amor; não o amor que eu achei que sentia. Era ligeiramente mais sóbrio e mais frio, coisa que demorei a entender e tentar querer aceitar.
A ilusão é bastante doce. A realidade tem é outro gosto.
Não sei por onde começar para recuperar minha sanidade. Está tudo bastante confuso ainda. Minhas mãos tremem quando penso no que vou encontrar quando voltar. Minha mente pára.
Somente o branco é real, o que confirma minha possível ignorância.
Atravesse o oceano e venha ao meu encontro. Traga consigo o sorriso perfeito, os chocolates, e as lágrimas para eu poder secá-las.
Você é minha vida há muito; e a ideia de dividir meu ar com alguém que não seja você é intolerável! Pensando, descobri que a única parte humanamente inteligível do meu ser é o nosso amor.
Tu me deixastes aqui e eu permaneci imutável durante todo esse tempo. Todavia, meu amor cresceu desesperado pela sua presença e eu não posso mais suportar a saudade.
Para Isabella Proença, minha vida.
Eu cheguei ao cúmulo de achar que essa máscara era impecavelmente forte e real. Enganei-me.
A fortaleza que eu demorei meses pra contruir foi derrubada no segundo em que você sorriu pra mim. Tudo fez sentido naquele exato segundo. Percebi que não havia o “nós”, e que, por mais perfeito que fosse seu olhar, não era como eu desejei. Faltava saudade, malícia; faltava um plural naquilo.
Mas eu fui até forte, acredita? Contive-me e não derramei nenhuma lágrima. Aliás, não derramei nenhuma lágrima que você pudesse ver.
Eu estava gritando desesperado por algo que meu lado racional sabia não ser possível no momento: nós, juntos, de novo.
Resolvi fugir de casa para sempre amém.
Acordei e pus a mochila nas costas. Dentro dela, uma lata de ervilhas, uma maçã e um livro. Destino? Não.
Nada importa agora; nem pessoas, nem casa e nem comida. Serei anti social até o pôr do sol. Sei caminhar até o portão de casa. Depois disso, a estrada é completamente desconhecida.
Na cozinha, encontrei minha mãe.
- Vou fugir de casa para sempre – disse.
- Quando voltar toque a campainha, meu filho.
No caminho até a porta, perguntei-me qual parte do “para sempre” ela não compreendera. Passei do portão, enfim. A chuva começou. Com ela, os trovões. Com eles, meu medo.
Virei-me e hesitei por exatos três segundos em apertar a campainha. Meu lado racional insistia em não fazê-lo, mas como sempre foi vencido pela emoção. Ouvi o barulho do portão sendo destravado e corri imediatamente para os braços de minha mãe.
- Eu estava fugindo para a Terra do Nunca, mãe.
Quando amo, perco completamente a sanidade. E todas as características que fazem de mim uma pessoa madura, desaparecem.
Não quero ser ninguém importante.
Eu quero ser eu, só.
Aliás, eu e minhas outras milhões de versões de mim.
Eu não vou tentar te confortar com palavras faladas.
Vou te abraçar e fazer cafuné. Se isso te deixar melhor, você ganha um beijo e uma bala. E só.
Mas tem que ser de noite. Quando não tiver ninguém vendo.
No escuro.
Sinceramente, eu odeio e amo.
E, sinceramente, não sei o quê, e nem sei estabelecer a diferença entre essas duas malditas coisas.
Isso é mentira! Eu sei muitíssimo bem o quê (lê-se: quem) é. E sei também que o que eu sinto está infinitamente distante da raiva.
O problema de tudo isso é que a parte de mim que não existe não quer aceitar isso.
Não sou ninguém importante e meu nome será logo esquecido. Tenho 98 anos, mas meu pai diz que não.
Eu gosto de azul e vermelho. Há dias em que gosto de cinza, mas são dias-quase-nunca.
Eu passo horas olhando nuvens.
Não acho que os olhos sejam a janela da alma; olhos mentem.
Apego-me fácil a humanos.
Tenho ouvidos seletivissíssimos. Gosto de música clássica e folk-rock.
Tenho uma pilha de livros e CDs, no quarto.
Queria ser capaz de montar um quebra cabeça de duas mil peças. Eu não consigo fazer isso. Sério, minha paciência não me permite!
Eu esqueço nomes de coisas e pessoas. Minha memória (ou a falta dela) é meu pior defeito.
Ó, não me dê relógios de presente. O tempo é só uma das centenas de coisas que me causam medo.
Nasci na época errada e no país errado. E eu não sou nada patriota!
Gosto muitíssimo exageradamente muito demasiadamente demais de queijos, ervilhas e brócolis.
Quero viver numa casinha de madeira no interior da França, numa cidade fria. Haverá xícaras, chá e biscoitos. Xadrez e cadeiras de balanço também serão bem vindos. Um piano na sala, por favor.
Queria poder pegar a sua mão e correr pra algum lugar bonito; um campo, quem sabe. Queria poder sentir o seu abraço em meu corpo frio. Poder ver que você é verdadeiramente real. Poder ouvir sua voz e fazer você me ouvir gritar o quanto eu te amo.
Queria ver você, só por um instante, e dizer o quanto você se tornou importante pra mim. Uma parte que não é mais possível remover de minha humilde minha alma, uma parte inevitável do meu ser.
Sem você é como se eu não pudesse realmente viver (e não estou exagerando, não agora). Isso se resume no que as pessoas dizem como "Eu te Amo", e que eu resumo em algo como ''Minha alma grita pelo seu sorriso e por você."
- Você faz uma aspas no braço esquerdo, e eu faço uma no braço direito.
- Ou senão nos dois braços.
- Não! Eu imaginei assim: se tiver um mundo inteiro entre nós, nós sempre seremos o começo e o fim do outro. Entende?
Ad Infinitium.
É uma questão de tempo pra eu encontrá-la novamente. Sentir abraços, sentir carinhos, sentir coisas que não são normais ao meu ser, sentir um frio súbito na barriga. Sentir saudade até quando ela vai dormir na sala ao lado. (Eu não gosto quando ela faz isso. Cabem dois corpos numa cama de solteiro sim!)
Ela implora para que eu agüente firme, mas algo me preocupa: Até quando? Quando é que eu vou conseguir anular toda essa necessidade dela que surge em mim a cada dia? Não, não é fácil. É como ter a melhor parte de ti em outra parte do mundo. Eu busco. Busco na noite, busco as mãos dela no escuro; busco até no claro. E encontro só o silêncio. Ela está no silêncio também. Ela está em mim. Dentro e fora.