Graziela Dias
Não pense nem por um momento que estou penejando por você. Eu apenas estou escrevendo sobre você, porque é algo do qual tenho muito a falar. Não queria que as coisas fossem dessa forma, eu poderia te ligar hoje, mas felizmente já exclui seu numero para o caso de essa vontade vir. As vezes é legal parar de ser completamente abismado e questionador, você deveria experimentar.
E eu queria te agradecer, não por tudo, mas pelo nada que ficou desde que você se foi. Isso me fez pensar em mim mesma.
Porque não tinha ninguém e porque não queria conversar com seu psiquiatra sobre suicídio. E ela não tinha coragem de se suicidar, porque tinha medo de tudo aquilo que não conhecia. E queria conhecer a morte, que tantas e tantas vezes lhe deu Tchau.
(...) Deixou a musica tocar e se enrolou na cama, queria ter algo para fazer, como todos na sua idade, mas não tinha. E o motivo de chorar tanto era ser muito sensível e não queria ser sensível porque normalmente é deprimente. E ela já era deprimente demais. E todos lhe diziam isso. E ela sempre se esforçava para não ser.
Na noite da dor, esqueceu de sentir algo, e as vezes não sentia, só mantinha sua cara fechada para todos. Sentava no seu canto e lia seu livro, e ninguém lhe notava, a não ser os que a achavam estranha demais, estranha por não ser extravagante, estranha por não ter amigos e por ser deprimente demais. E ela era muito deprimente, e todos lhe diziam isso, e eu acho que essa é a segunda vez que lhe conto isso, mas acho que é porque ela estava bastante deprimente naquele dia, quando finalmente tomou coragem e atirou na própria cabeça, com o rifle de seu pai, que vivia mostrando a arma por todo canto. E a morte veio, e ela era mais deprimente do que a garota, que em cima do balcão da cozinha, deixou um bilhete. E o bilhete dizia coisas lindas, e eu queria ter lido, mas só pude ouvir, e eu queria ter visto como ela escreveu, porque ela escreve bem, e eu chorei quando ouvi suas palavras, chorei porque acho que também sou deprimente. E acho que sou mais deprimida do que ela, porque eu estou observando seu corpo ser enterrado, e acho que vi seus olhos abrirem, e vi sua dor, e suas lagrimas, e acho que sinto muito, porque chorei, e ninguém podia me ver, porque além de tudo, sou apenas um estado da mente. E eu morri também.
(...)Qualquer coisa que não fosse me deprimir seria o suficiente para suprimir os sentimentos paralelos sobre coisas que ainda não vivenciei.
(...) Deixei-me elucidar para você, é que aos poucos perdi a excitação da vida, por simplesmente me achar grande demais para esse mundo...
...Porque eu queria não acreditar em nada e não sentir nada como você, isso parece eletrizando, mas eu sou feita de sentimentos, e normalmente isso incomoda e doí muito. Porque no dia a dia, as pessoas irão te magoar e te decepcionar, e se você estiver ligado a elas por sentimentos, será bastante doloroso se despedir. E eu só não sinto isso, por não ter tido a chance de se decepcionar, pelo simples fato de que nunca tive alguém...
Acho que meu antigo eu sempre foi me trazendo para o que sou hoje, porque você sabe, as pessoas nunca me agradaram, e acho que sou idiota por isso.
Me canso tão rápido das pessoas que as vezes não dá tempo para se apegar a elas, e estou dizendo isso a você, porque parece ser o único que não se importa em ser amigo de alguém que não poderá ser boa para lhe dar conselhos.
"Ultimamente tem sido assim; acordar e querer voltar para a cama. Eu sei, parece drama, mas não é. Existe algo acontecendo dentro de mim, uma mistura de procura e desencontro, estou completamente perdida em mim mesma. E tenho me sentido assim todos os dias. Vivendo a base de sonos mal dormidos e comidas esquecidas no prato. Não estou a procura da luz no fim do túnel, e sim, do discernimento estonteante do sentir".