Gilvano Amorim Oliveira
As quatro vertentes da pedagogia do conhecimento no evento do Éden:
Gilvano Amorim Oliveira
O conhecimento é a alavanca da alma humana, uma moeda muito mais bem cotada que qualquer numerário monetário que a numismática possa dispor. O homem é, por natureza, vocação e comportamento, ávido por conhecimento. O conhecimento leva a guerras, mata, permite viver, enriquece, mutila e enobrece. O conhecimento divide classes mais que a desigual distribuição de rendas. Em cada íntimo humano há um apelo saudosista por conhecimento, uma espécie de busca às origens de uma instância inicial matricial. O desconhecimento embriológico cria o imaginário de um ambiente originário pleno e totipotencial. Desconhecemos nossa origem e nossa natureza pré-existencial. Este auto desconhecimento ontológico nos alavanca em direção ao saber como uma mariposa se vê atraída a uma fonte de luz. O conhecimento, visto assim, é caminho no sentido do alcance da autognose humana. Nascemos despidos de conhecimento e agregamos saber ao longo de nossos dias, em moto contínuo. Aprendemos desde o dia de nosso nascimento até o dia de nossa morte e a obra sapiencial, por mais elaborada que seja nas mentes mais brilhantes da humanidade, nunca está acabada e plena. Somente Deus é detentor do pleno conhecimento e da verdade absoluta e irrefutável. Por esta razão a busca por conhecimento aponta ao transcendental e passa pela espiritualidade. Sendo assim, vamos encontrar os registros mais antigos de adquirência de conhecimento no ambiente do Éden. Este modelo visto na cena do pecado original segundo descrito nas páginas bíblicas, apresenta os paradigmas de quatro modelos de se transmitir e, por conseguinte, de se adquirir conhecimento. Sem entrar no mérito da veracidade e precisão do texto, pois tal não é o objetivo neste texto, analisemos os fatos. Antes desta análise quero deixar registrado que a ideia inicial deste modelo que logo apresentarei não me é inédita. A ideia inicial me foi apresentada por um dos maiores pensadores em nosso meio, o Perito Samuel Amorim. Posto este crédito, vamos aos fatos. O capítulo três de Gênesis nos apresenta o diálogo da serpente, dominada pelo maligno, e a primeira mulher da história, Eva. Desta conversa podemos extrair quatro modelos pedagógicos no ensino do conhecimento de qualquer natureza. São eles:
1. O modelo mítico: O mito é a primeira e a mais singela das formas de aquisição de conhecimento. Em primeiro lugar vale resgatar o conceito de mito. A ideia de mito se trasmudou no mundo moderno para “coisa fictícia” ou “conto irreal”, mas o senso etimológico original está longe de ser este. O cerne do termo mito é a referência a um conhecimento que não pode ser aferido pela ciência ou pela filosofia. O mito exige crença. O mito demanda fé e, por isto, aponta com mais proximidade a espiritualidade em relação aos outros modelos da pedagogia do conhecimento. Em nosso cenário do Jardim do Éden a mulher faz referência a este modelo de aquisição de conhecimento ao contar que Deus havia simplesmente dito que não comessem da árvore do conhecimento do bem e do mal. Não houve argumentação nem demonstrações, simplesmente uma ordenação. Para adquirir o conhecimento de que não se devia comer desta árvore para não morrerem, Adão e Eva simplesmente creram. O mito aqui era que “comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal levava à morte”.
2. O modelo filosófico: Diante da manifestação de Eva acerca do conhecimento miticamente adquirido, a serpente argumenta inaugurando o modelo filosófico de transmissão de conhecimento. A argumentação traz um elemento novo, a figura da lógica. A lógica é um encadeamento racional de ideias. O pensamento assim disposto cria uma auto pedagogia. A argumentação da serpente é a primeira manifestação filosófica de que se tem notícia. A filosofia é, por primazia, uma fonte de transmissão e aquisição de conhecimento.
3. O modelo experimental: É no Jardim do Éden que vamos encontrar os elementos que deram à luz ao pensamento científico, o método experimental. O pensamento experimental parte de uma premissa elaborada e, por experimentação, confirma ou rejeita tal premissa. Sendo assim, a mulher olha para o fruto, o examina e, finalmente, morde-o numa típica experimentação. Estava inaugurada a ciência.
4. O modelo da experiência: Cumpre distinguir, em primeiro lugar, experiência de experimentação. Experimentação é expediente do pensamento científico, como visto acima. Experiência aqui é uma espécie de acidente. Notemos que Deus propõe a transmissão mítica, a serpente estabelece o pensamento filosófico e a mulher inaugura a experimentação científica. O homem, ao saber destes fatos toma uma atitude imediata e imediatista. Simplesmente se submete à experiência de comer a fruta proibida. O homem aprende pela experiência como quem pisa num fragmento cortante de vidro e se descobre ferido. Note-se o aspecto fortuito do evento e o resultado inesperado, elementos típicos da experiência. A diferença básica da experiência com a experimentação do método científico é a figura da premissa do método científico e o evento fortuito e não controlado. Depois da pisadela inadvertida, o homem aprende que pisar em caco de vidro corta a planta do pé.
Assim, encontramos no cenário do Jardim do Éden a estereotipização dos quatro modelos pelos quais se pode adquirir conhecimento na existência humana caminhante no sentido da libertação de sua maravilhosa ignorância.