gerson l. schwab
Haverá sempre redenção
Para quem fadado à sublimação da dor,
Teimosamente,
Transformar paixão em amor.
De compatível troco, da necessidade primitiva que eras,
Te transformaste, de verdade, em raposa imprescindível!
Minha memória, persistente em suas ansiedades,
Oportunamente falha para minhas conveniências,
Recusa-se a lembrar da verdade com que trabalha.
Eu me embriagava de tua tamanha presença, de teu sorriso que tua boca arreganha, inciso ao resto, despretensioso resto.
longa jornada noite adentro, ao centro do abissal oculto e,
dentro de minha parte, propositadamente longa e lenta.
Suspeito que as ondas mornas que envolviam meus movimentos, não eram do verão que já se ia, pois tu adornas o estio da estação.
nesse mesmo dia
meu coração insensato
por pura teimosia
quis curtir Vapor Barato,
aquele mesmo que em tua ironia
me perguntaste, um dia, se lembrava alguém.
devo dizer que agora lembraria,
lembra e sempre lembrará, também:
alguém fútil e triste
que se alma havia, vazia,
com uma tristeza que persiste
e da qual também eu adoeceria.
Quando te vejo por perto
por certo não me preocupa
a perfeição da rima.
Não importa se em cima
ou embaixo
eu me encaixo em qualquer canto
desse antro, nessa aresta,
qualquer fresta
da enorme festa que me ofertas.
e embora me canse essa lembrança
ela me aquece
e é doce afago ao coração,
principalmente quando a noite é fria,
quando emprestas tua voz ao vento
que sussurra pelas frestas da janela
aquilo tudo que jamais disseste.
Quisera mais a fundo
explorar tuas jazidas
pois quando me aprofundo
nestas vindas e idas
na cova do teu umbigo
encontro seguro amparo
como encontrei abrigo
nos olhos em verde-claro.
Meus pensamentos se põem a desenhar
Como serás na fauna e flora dessa minha distopia:
Talvez árvore frondosa
Soberba sombra à minha estrada
Talvez ressequida planta, e pelada,
Como ao final do verão te vi
Chorando antes da nem tão consentida ida.
Vou com letras, pois, brincar
escolher os sons melhores
vou também almodovar
na paixão que tu colores.
Sei que minhas letras são
alguns poucos versos mancos
como bolhas de sabão
desbravando os mansos flancos.
Em nosso caso, a pensar por tua maneira,
Foi muito bom que não houvesse persistido,
Pois era insólita aventura borralheira
Sonata falsa com regente em bebedeira
Onde o pior foi mesmo ter acontecido.
Por mais tanto que ele peque
Pelo que o fado lhe atraia
Sabe que é de Deus cobaia
Sendo sempre posto em cheque
Quando a vida se distraia.
Trata a vida com desdém
Vida é reles folhetim,
Mas pular desse selim
Nem um pouco isso convém.
E ele sabe disso, sim.
O gostoso feijão louco que um dia
Foi o melhor da minha nutrição
Agora simplesmente causa azia.
Não creio que te deste por paixão.
Desculpe, mas somente parecia,
Um reles prêmio de consolação.
Com a voz nós seduzimos
E fazemos mil promessas:
"Vou sentir a tua falta"
"Vais me ver em meu jardim?"
Mesmo um simples: "Pode ser!"
Mais complexas confissões:
"Eu sonhei a noite toda
Só contigo eu sonhei"
Até vir a mais fatal
"Faça como você gosta".
Mas já na noite seguinte
Surge um "Não vai rolar, não".
Vieste a mim (eu só) com tal braveza
E vieste a fim de guerra, em campanha,
Buscando caça mais fraca e em lerdeza.
Porém vê só como é a vida estranha:
Tu que vieste atrás de fraca presa
Foste presa abatida em tal façanha.
Afundado em tristeza olho a cama vazia
A mesma que foi, fria noite, nosso ninho.
Nela te vejo em posição mesma e vadia
Pernas acima, meu covil onde me aninho.
Valeu, então, esse tamanho sentimento?
Para ti, já sei: " - Então tá, valeu por tudo!"
Para mim, desde o primeiro e feliz momento
Adivinhava o precioso conteúdo.
Quando em vigor da juventude, seu fomento,
Eu esbanjara brechas em estado agudo,
Desperdiçara conjunções em desalento,
Mas alma e corpo, frente a ti, ora desnudo.
Se nisso grudo, me perdoes o incremento,
Já que me achaste desde sempre cabeçudo,
Mas o veneno das palavras, meu tormento,
Grita e me obriga a deixar de ser tartamudo.
Pois que me sirva isso como testamento:
Valeu por tudo! Então tá; ou valeu pôr tudo?