Felipe Plugrad
A vida é curta demais para ter medo do passado e tomar decisões pensando apenas no futuro. Meu futuro pode estar longe demais e não quero deixar de aproveitar os últimos e, talvez, breves momentos da minha vida. Existem laços fortes e outros fracos. Amarre muito bem os fortes, ou deixe que o vento os leve. Um outro dia desses, a vida pode querer atá-los novamente. Eu não sou um Deus, nem iluminado, mas tenho certeza: se a vida se atrever a fazer isso mais uma vez, vai ter que ser mais convincente comigo. Ou talvez ela morra insistente, assim como eu.
ALCANCE
Alcançar. É o instinto humano básico. O dom, ou defeito, de estar sempre alcançando e batalhando. Alguns humanos, esperam que o destino traga o seu desejo em seu alcance. Outros, corajosos, travam guerras e matam tanto semelhantes quanto conceitos éticos. O alcance é a arma mais perigosa na mão desta, que deveria ser humilde, raça uma humana. Mas até onde o desejo é poderoso a ponto de cegar o seu usuário, como um feitiço trevoso que mostra sua face real? Dom deveria ser o nome, por tornar o homem digno e guerreiro? Defeito deveria ser amaldiçoado, para que a existência transpasse o olhar em sua possível ignorância? Seriamente, como de início, o que é o dom-defeito do alcance, se não fazer do ser humano um animal cego, egoísta e objetivo? A reflexão na morte é a tortura plena, justa. É o que esperamos, mesmo sabendo do valor da corrida mortal. E juntamente com o castigo da mortalidade vem a verdade: sabemos que estamos correndo cegamente para o egoísmo, admitimos no passado, presente e futuro. Alegamos com toda a certeza de que vimos o que perdemos. Só, infelizmente, não tivemos resposta quando a vida nos perguntou o porquê de deixar tudo para trás.
TEMPO DECIFRADO
Os instantes passam incompreendíveis para alguns. Alguns momentos são captados com certo esforço. Poucos momentos são compreendidos com muito sacrifício. E momentos finalmente concluem histórias. Para desconhecidos há a dúvida e para personagens, a resposta. E poucos personagens escreveram o roteiro desta história. Dois são os protagonistas: o lado branco, benéfico, aquele que fez a história formar-se, se esforçou e decidiu seu final feliz; e o lado negro, maléfico, aquele que escutou, assistiu, gritou, reclamou, apanhou. Respostas ele só encontrou quando estava parado, tentando compreender enquanto o tempo passava. E as horas passavam rápidas e torturantes demais. Neste meio tempo, vejo os sinais, como os vi o tempo inteiro, passando em frente aos meus olhos, resquícios da pura verdade. Dois humanos sujos que jogaram tudo por conta do destino. Alegrias, ruinas, defeitos, lágrimas: todas compartilhadas com a presença de uma corrente indestrutível. Com o decorrer do roteiro, os personagens começaram a mudar de forma; uma análise real. Mãos sem sentido próprio, rostos sem memória e corações sem rumo. Nenhuma gota de sangue foi derramada, embora desejou-se. O tempo passou, e a névoa pesou sobre a cidade, o cenário perfeito para a guerra interior. Logo, o lado branco e o lado negro revelariam o verdadeiro sentido de sua existência: o propósito de serem o oposto. O lado branco sempre irá possuir trevas, sempre em um canto, a escuridão estará suprimida, esquecida. O lado negro terá, por sua vez, a luz brilhante, escondida no fundo do coração. Porque não há um ser vivo neste e em outros mundos capaz de escrever uma história sem luz. O lado brando já contagiou a si mesmo, infectou-se com a paz e o desejo realizado. Não há trevas que o transformem. E o lado negro evoluiu, deixou que a luz compacta tomasse conta dele, tornando-o um guerreiro. Esse guerreiro ouve, sente e, principalmente, vê. O no desfecho dessa história ele percebe o início de outra. Aquele sinal indecifrável revela o sentido de tudo. Porque não se deve esperar que a vida e os laços mostrem o caminho a seguir ou o amor a doar. Por mais insignificante que sejam os seus movimentos, mova-se! Se mover é o básico. E é com seus novos olhos que o guerreiro entendeu a barreira negra que o cercava. Ele agora é treinado. Ou ele pensa que é. Mas isso é bom: é o solavanco inicial para que ele lute, vença, sofra e morra, sabendo que se moveu desta vez. Mesmo que a barreira volte a envolvê-lo e ele se torne mais sombrio que as sombras na noite, essa escuridão nunca penetrará seu coração, e ele irá morrer e reencarnar protegido dela. Ele não lutará pelas respostas agora: lutará pela permanência, o que não fez com seu élo partido. Agora, mais do que nunca, ele encontrará o lado negro perdido e solitário que o completa. Pois solitários todos somos. Precisamos encontrar a corrente que nos suporta, querer e lutar por ela. Pois ela vale a pena. Basta se mover.
A FACE DA VONTADE
Das armadilhas de minha vida, nenhuma foi tão dormente quanto esta floresta. Cada raiz que se aproxima no escuro é uma lembrança do passado. Nos galhos, sobem os insetos das recordações: eles cobrem o teto da mata. Pelos caules e suas cascas escorrem as lágrimas daqueles que choraram sem a nossa ajuda, enquanto as folhas caem como os corações partidos. Essa floresta é como um lugar onde o mundo deposita sua tristeza. Árvores, plantas, seres infinitos, todos juntos no mesmo buraco sombrio; todos mergulhados no mar da escuridão antes de sua chegada. Mas eu estou só de passagem por aqui. Vim para ver se a minha tristeza se encontra, mas eu procuro e não encontro. Eu sei que irei encontrá-la, vim para cá por vontade própria, e somente esses têm capacidade para sair quando quiserem. É quando termina o passeio da treva que se encontra o filho da mesma. Chegou a hora de abandonar esse barco e remar para a realidade. Mas essa tristeza sem fim não é a maldita realidade? A realidade desta insanidade é o conjunto de dentes e carniça que mastigam as árvores no fundo da floresta. O monstro abocanha as plantas inteiras e as cospe rapidamente no riacho de águas claras; o rio que leva ao lugar que procuro: a porta de saída. Esse monstro, com seu rosto deprimido para que não pensem que é bem-vindo, deve ser a consciência, mastigando a infelicidade para transformá-la em aprendizado, em evolução. Pois nas trevas mais malignas ainda há esperança. Agora caminho para a porta, que está aberta aos visitantes. É a porta do desejo; daqueles que desejam sair. Pois os que preferem mergulhar na tristeza não possuem a chave, e assim podem desaparecem contra a felicidade que não querem ver.
FLASH FORWARD
Ridículo é o coração humano que ama quando deve odiar e odeia quando deve amar. Mas ainda devemos compreendê-lo porque continua nem sempre cometendo esse suicídio. Vá rápido! Corra para onde possa se esconder. E se não conseguir, tolere. Pois a tortura não é plena. Ela é pouco: ainda virá mais!! Flash forward!
TRADUÇÃO
Para tudo existe um significado. Toda criação tem uma razão. Toda concepção tem um sentido; um valor. Cabe ao leitor traduzir a sua existência. O ar que respiramos, as pessoas com quem convivemos, os pensamentos que viajam pela mente: todos têm uma tradução. Eles não nasceram sem um objetivo, e navegam entre o incerto e o incentivo. Os passos que damos rumam à um destino. As palavras que dizemos expelem graças à uma fagulha da criação. São nossos instintos desconhecidos formando as sílabas de nossas vontades. Tudo tem um sentido nessa vida, e em tantas outras. O acaso só existe para quem não traduz sua caminhada; e toda caminhada tem uma chegada. Faz-se o acaso para os que não enxergam o embaraço do desconhecido. E mais uma certeza é bem-vinda: não existe nada sem tradução, apenas existem coisas que são difíceis de traduzir, e uma delas é a nossa vida, algo que só absorvemos o sentido quando morremos.
Porque é lá que temos certeza do porque surgimos, e se completamos nossa tarefa com os que amamos.
Siga a estrada da certeza e, de vez em quando, atalhe também pela dúvida, para compreender que seu destino sempre será o mesmo. Ele é selado em você no momento em que nasce e NADA irá mudar sua linha de chegada. Apenas a pista da corrida trará empecilhos a serem desintegrados. Incinere seus obstáculos! Junte as cinzas e forme a trilha para os que seguem o caminho com você. Talvez eles tenham dificuldade para traduzir a vida. Ouça o som do mar, ou então, o do tráfego da cidade, porque você certamente estará onde deve estar. Mas ouça! Veja! Toque! Sinta! Apele para seus sentidos físicos e espirituais. Eles são nosso porto seguro. Eles são os nossos tradutores. E sem o significados das palavras da vida, não somos absolutamente nada; somos pedaços de carne vagando pelo mundo.
E você? Já traduziu sua existência hoje?!
ESCOLHAS
Até que me provem o contrário, posso ir para onde eu quiser.
Posso peregrinar pelo deserto da incerteza e parar por um instante para questionar a forma das dunas.
Posso caminhar com meus próprios pés e rastejar quando achar devido.
Ainda posso me dar o luxo de me orgulhar e de, logo depois, mudar de idéia sobre o que tenho feito.
Posso supor algo e mudar meu pensamento quantas vezes forem necessárias. E não ter vergonha disto.
Posso ter a certeza de que a minha mente é uma constante evolução. Certeza de que meus pensamentos regridem, mas também avançam.
Eu ainda posso mastigar a areia na hora da fome e correr procurando o fim quando achar que ele é meu destino.
Eu ainda possuo o direito de achar, de viver e de ser.
Posso provar que vejo, ouço, sinto e toco; e estar certo de que, quando o momento chegar, perderei estes sentidos pouco a pouco.
Posso ter medo e chorar quando estiver mais solitário do que de costume.
Posso conversar com minha própria voz, augurando o eco.
Posso dissecar minhas palavras e procurar nelas o sentido de minha existência.
Posso crer que minha vida tem um propósito assim como pode não ter.
Posso contar com variáveis ou ter força para subir os degraus pouco a pouco.
Acredito que posso fazer minhas escolhas e juntamente suprir o desejo alheio.
Ou posso apenas enfurecer minha alma e agir como se eu fosse o único.
Posso me arrepender, sofrer e sorrir às momices do meu coração.
Posso sentir aroma de rosas no enxofre e cientemente enganar-me com isso.
Posso percorrer campos sangrentos e decair por minha intrepidez.
Juro que posso moldar meu rosto ou conflagrá-lo no incerto.
Posso viver como um bobo ou tornar-me amante de uma castelã.
Posso passar noites acordado com os olhos na janela, esperançoso, ou apenas rabiscar a estratégia do dia seguinte.
Posso acreditar que o passado foi queimado e o presente tem esse nome por ser uma dádiva.
Posso iniciar a guerra em meus próprios campos ou sacrificar-me pela paz nos montes do próximo.
Posso ter raízes e motivos para voltar ou encontrar novas plantações no horizonte.
Posso ter infinitos motivos para acertar ou um motivo forte e finito para o equívoco.
Posso ter várias escolhas.
Posso eu? Ou devo?