Éder Persa
Se alguém julga o teu comportamento ou a você, é porque, inconscientemente, ele reconhece esses padrões, pois os tem dentro de si — não há, então, como condenar algo desconhecido. Na verdade, o que ocorre é que, por não conseguir identificá-los em si, projeta no outro, como uma serpente destila o veneno a fim de eliminar a negatividade.
Se quer ter valor, morra ou vá embora: para quem vê de longe, todo mundo é louro; para quem vê de perto, todo mundo é lixo.
Não é que o outro o incomode, é que tu se incomodas com o outro;
Não é que o outro seja mau, é que teus olhos não veem a bondade;
Não é que o outro não o ame, é que te falta amor por si;
Não é que o mundo seja sombrio, é que é essa a tua disposição em enxergá-lo;
Não é que não haja luz, é que tua visão ainda é turva;
Não é que te falte o suprimento, é que ainda não observaste a riqueza ao teu redor;
Não é que tu sejas solitário, é que ainda não olhaste para dentro;
Não é que tu não tenhas paz, é que não compreendeste a bênção do silêncio;
Não é que tu não tenhas conhecimento, é que não se permitiste a observação;
Não é que tu não sejas sábio, é que não sabes o que é ser vácuo.
Quem vive de carências, em si, não vive; quer dos outros o que não encontrou em si ― vive enganado, porque, na realidade, já possui tudo. Quem o fez encontrou tudo o que há: não há nada lá fora.
Só necessita ser levado a sério aquilo que não tem importância; assim, a forma de exaltá-lo é dar o que lhe falta. O que já é relevante, em si, já tem tudo de que necessita, ou não necessita, bastando só a si mesmo.
Quem ama com a mente não ama, traduz o ego. Se você quer, você tem vontade; se você tem vontade, você deseja; se você deseja, se impõe a si mesmo um obstáculo. Mas o amor é absoluto: pois que encerra o todo; não cria resistências, pois que não impede o fluxo; não suprime a liberdade, pois que não obstaculiza a harmonia; não deseja, pois que não transgride a vida.
Acredito que o motivo por que tanta atenção seja dada à opinião e ao pensamento dos outros deva consistir nisso: quando se pensa ou opina algo sobre outrem, espera-se que isso seja validado e acatado; então, dá-se importância e validez ao pensamento do outro tendo em vista que com o seu seja feito de tal maneira. É simples.
O VÉU
Descobri a sabedoria do silêncio ao me deparar com o caos das multidões e com o barulho das mentes vazias; ele me revelou que, quando a palavra já cumpriu a sua finalidade, por consequência, perde seu significado, e que o inaudível é a própria linguagem de Deus.
Descobri o amor ao ver o quanto o buscava nos outros; a partir disso, entendi que, nesse sentido, a verdade é uma só: o amor está em mim, pois que é essa a minha própria substância; e que tudo que receber de fora será por reflexo daquilo que houver oferecido.
Descobri a importância de respeitar o espaço das pessoas quando o meu próprio foi posto à prova; e isso me fez dissociar qualquer antiga ideia de espaço, por ele não existir; qualquer lugar em que esteja será sempre o meu "aqui".
Descobri que não me voltar demais ao passado ou planejar demais o futuro fazia bem quando percebi que o "ontem" ontem era hoje, e o "amanhã" amanhã também será hoje; ambos convergem ao mesmo ponto, porque ele é uma dádiva, e, por isso, se chama presente.
Descobri o quanto é importante seguir o fluxo da vida e não resistir às tempestades que tentavam me abalar em meio à efemeridade de tudo que me cercava; assim, compreendi a maravilha que é ser vento, ser fluido, de não parar, de deixar ir, de não prender, de não pedir.
Descobri o quão relevante é a pureza da alma ao vê-la tocada por mãos sujas de vaidade e egoísmo; a partir daí, entendi que o sol não pode brilhar através de uma vidraça imunda, e que não se pode contar as melhores histórias senão em papéis em branco.
Descobri que a paz começa em mim e que não pode ser encontrada lá fora ao perceber que em vão a atribuía somente à quietude externa; então, passei a alimentá-la em mim mesmo, porque em mim ela já existia, só necessitando minha atenção para, como uma muda que cresce ao ser regada, ser manifestada.
Descobri que eu, somente eu, poderia me guiar quando confrontado por quem dizia saber o melhor para mim; daí, pude enxergar que a verdade não é universal; mas o que condiz com cada um; mais ainda, é aquilo em que se crê, e não aquilo que dizem ser.
Descobri que não dar atenção à crítica ou à opinião alheia tornaria mais suave a experiência da vida ao observar o quanto eu me desdobrava a fim de me ajustar a isso, mesmo que implicasse em me depreciar; hoje, a própria observação me demonstrou que o que se julga nos outros é exatamente o que se falta vencer em si; e, sendo assim, o julgamento se torna um modo de esconder as próprias fraquezas, fazendo de quem o recebe um espelho, o qual revela muito mais a respeito de quem julga do que de quem é julgado.
Descobri, ainda, que cada evento na vida possui tempo para ser e que não se pode contrariar a sua espontaneidade ao tentar apressar o que ainda não se pode receber, ou retardar o que já está no tempo de aprender; dessa maneira, tornou-se possível compreender que o que fosse para o bem sucederia no momento oportuno, sem expectativas; assim, surgiu também o respeito pelo ritmo da vida, pois que não há sincronicidade maior senão na cadência e alternância das estações do ano, no fluxo e refluxo das marés, ou no nascer do sol e no seu ocaso.
Um dos indicadores de uma grande alma é a quantidade de árbitros que a ela se opõem. Quanto mais corretos estivermos, mais inimigos atrairemos. Continuar em acordo com a nossa verdade individual nos custará a perda de apoio externo; mas, em compensação, nos aliviará a consciência ao ter em vista que a falta do mesmo implica em aumentar a sensação de auto apoio, que é interno, pessoal e intransferível.
O que os outros dizem é de total responsabilidade deles; assim, nada necessariamente nos diz respeito senão a nossa própria concepção acerca de nós mesmos. Preocupar-se com julgamentos não nos diz nada: o que tem relevância é ser autêntico, original e verdadeiro. Se alguém consegue carregar ao menos uma dessas características, já poderá ter certeza de ter dado a mínima contribuição à humanidade.
Um idiota nunca quer ser idiota sozinho. Um ignorante sempre tem algo a compartilhar: ele quer ver todos a seu patamar; porque se considera a si mesmo pequeno e indigno de conseguir se elevar, quer diminuir os outros até vê-los próximos a si.