dark rouge
Punição.
É justo punir o ser humano por ser falho? Possivelmente. No entanto, essa é literalmente sua função, falhar, aprender e repetir. É algo cíclico, interpreto como a epistemologia de Sócrates, ironia e maiêutica. Perguntar, responder, repetir. Falhar, aprender, repetir. Ambas teorias são farinha do mesmo saco, embora disfarçadas como psicos diferentes, talvez como os liberais e conservadores na época de Dom Pedro II. Somos nós então capazes de julgar o outro ser humano? Sequer deveríamos ter esse direito? Somos mais falhos do que Crasso, mas ainda assim nos cremos mais capazes do que Júlio César. O ser humano erra, e provavelmente é isso que deu origem a palavra humano, mas ainda assim temos que pagar pelo nosso equívoco. A única pergunta é, qual é o preço justo a ser pago? E principalmente, quem define isso? Os outros seres humanos, cujo a essência também é falha? Ou serão os deuses, os quais ninguém sabe a veracidade da sua existência. “Você não tem vergonha do que fez? Olhe para si mesmo” gritam as massas. Afirmação errônea, óbvio, mas talvez este deva ser o real motivo da vergonha, olhamos demais para nós mesmos. O único motivo pelo qual não nós afogamos como Narciso, é porque aprendemos a nadar, não porque deixamos de contemplar excessivamente a nós mesmos. Um sábio amigo meu uma vez me disse “Num mundo de monstros, ninguém é vilão”, acredito nessa afirmação como acredito na existência da gravidade, formato geoide da terra e eficácia da vacina. O falho ser humano deve ser constantemente relembrado de que toda história tem três lados, o da vítima, do vilão, e a verdade. Caso contrário, estaremos eternamente condenados ao caos.
Amor.
Depois de muita reflexão, consegui compreender que tudo escrito sobre o amor é verdadeiro. Shakespeare dizia que é melhor viver sem felicidade do que sem amor. Acredito que isso signifique que o amor por si só vale muito mais que a felicidade, pois com ele se experiencia a alegria e muito além. Ele também pensava que as viagens terminavam com o encontro dos apaixonados, é tão surreal que pode ser comparado ao incrível, e o incrível é literalmente algo tão sensacional que não se consegue crer. Eu particularmente nunca vivi algo assim, mas não me restam dúvidas que Shakespeare já. O amor existe de várias formas, como dizia Machado de Assis. Ele pode existir de forma mais fantástica, singela ou passageira. O que não é avisado a nós é que ele existe de forma cruel, de uma forma tão dolorosa que pode ser comparada à uma tortura. Esse é o amor não correspondido, e ele eu sim vivenciei. Ele é tão cruel que mata aos poucos as suas vítimas. Nos filmes assistimos ao amor fantástico, nos livros lemos sobre o utópico. Mas e na vida real? O que fazemos quando nossa história de amor não é como a dos contos de fadas? O que fazer quando o único a se apaixonar somos nós? A maioria dos amores é recíproco. Mas o que ocorre com os demais? Como fica nossa história? Nos tornamos vítimas do amor, participantes de um conto de fadas unilateral, prosistas de um monólogo. Somos amaldiçoados pelo felizes para sempre, e rejeitados pela realidade. Somos os incapacitados cujo as vagas nos estacionamentos foram roubadas pelos queridos por alguém.
Dor.
Dói demais, tudo dentro de mim grita, mas eu calo. Minha boca diz que está tudo bem, mas meu coração aos prantos diz, estou quebrado. Como é justo a recordação da felicidade não ser mais felicidade, enquanto a recordação da dor, ainda ser dor? Como é justo o sorriso desassomar-se, mas as cicatrizes nunca se curarem? Ainda é aprendizado a dor que você se convence sentir por um propósito? Ou simplesmente os deuses estão te punindo por razões pelas quais você sequer entende? Você está ajoelhado no chuveiro implorando a qualquer força divina para te salvar, para demonstrar misericórdia pela sua alma desacreditada, mas nada acontece. Você está só, não há Deus ou milagre que te salve. Você morreu por dentro, mas seu corpo bravamente segue seus instintos primatas de sobrevivência, e assim te faz resistir à tortura diária que é viver. Viver não, existir. Porque o que você enfrenta todos os dias, não é vida alguma, é apenas a reprodução das predisposições naturais do ser humano. Não há como lutar contra, superar, vencer ou dominar a dor, o único que se pode fazer, é aprender a viver com ela antes que ela te mate. Na guerra contra o caos, ou se adapta a ele, ou se deixa ser morto por ele. Não há vencedores nesta batalha, há apenas sobreviventes.
Pandora.
Por que o errado é tão tentador? Por que o proibido é mais gostoso? Será que o ser humano é atraído pelo impróprio? Ou será que o condenável é o mais poderoso afrodisíaco? Poderoso ao ponto de inibir toda a moral e caráter do ser humano, de o transformar no ser mais depravado no momento, e fazer com que ele não ligue. Pessoas como eu se deixam enfeitiçar pelo que não deve ser feito, pois nada se compara a adrenalina do perigo. A excitação que corre pelas suas veias é tão real quanto o ar que você respira, e você só quer seguir pecando, mesmo que isso possa destruir toda a sua vida. Será que a sensação de estar com ele se tornou uma droga da qual não posso me livrar? Será que me permiti viciar no mais poderoso afrodisíaco? Não faço a mínima ideia de onde isso vai nos levar, se é a minha cabeça que acabará em uma bandeja de prata, ou se é a dele. Só sei que abri a caixa de pandora, libertei todos os monstros que estavam escondidos dentro de mim, e agora eles nunca mais aceitarão ser enjaulados.
Calor.
Calor queimando minha pele. Formigamentos pelo meu corpo. Pernas bambas. Minha cabeça está a mil, só penso nele, em seu corpo nu e suado pressionado contra o meu. Consigo visualizar como se estivesse acontecendo nesse exato momento, sua mão em volta do meu pescoço, me sufocando enquanto geme meu nome. Tudo que queria era consumi-lo, e que ele me consumisse, inteira e intensamente. Sinto até agora suas mãos massageando meu corpo, suas palavras sussurradas ecoando pela minha cabeça, sua boca beijando meu pescoço, e descendo cada vez mais. Preciso dele agora, preciso dele me possuindo e sendo possuído por mim. Necessito da sensação de tê-lo novamente, e cada vez de forma mais exorbitante e profunda. Quero seus dedos percorrendo meu corpo por inteiro, entrando em contado com cada nervo meu, arrepiando todos os pelos da minha pele. Quero dominar e ser dominada. Anseio dizer sim para todas as experiências novas que ele possa me proporcionar, e que ele diga sim à todas as minhas fantasias que apenas ele teria a capacidade de realizar. Preciso tê-lo dentro de mim, mas não posso, e isso me excita cada vez mais.
Para o primeiro governante absoluto de Roma (vezes -1):
A nua e crua verdade é que eu sempre soube quem você era, mas por não saber quem eu era, me deixei levar pela ideia de quem eu gostaria que você fosse.
Saudade.
Saudade. Dizem que é a presença dos ausentes, mas acredito que seja simplesmente o mecanismo mais cruel e doloroso de tortura. Não há nada mais maléfico do que o aperto no peito causado pela falta de alguém que não se pode ter, tocar ou sequer conversar. Tudo que resta é a memória da felicidade que já se teve um dia, e hoje simplesmente se tornou um vazio. Um vazio não, um buraco negro, que consome todo o seu tempo, energia e alegria. É de fato uma força tão intensa que nada, nenhuma partícula ou radiação de luz pode escapar dela. A saudade é uma feridade que não cicatriza, um sangramento que não estanca. O pior de tudo, é que não tem como se livrar dela, é um sofrimento constante, tudo que se pode fazer a aprender a gostar da dor.
Nota adicional da autora: posso até sentir falta dele, mas não sinto falta alguma de quem eu era perto dele.