Daniela Arbex
O descaso diante da realidade nos transforma em prisioneiros dela. Ao ignorá-la, nos tornamos cúmplices dos crimes que se repetem diariamente diante de nossos olhos.
Enquanto o silêncio acobertar a indiferença, a sociedade continuará avançando em direção ao passado de barbárie. É tempo de escrever uma nova história e de mudar o final.
O trabalho dos legistas junto às vítimas seguiu silencioso durante quase todo o período, mas, de tempos em tempos, podiam-se ouvir lamentos que quebravam a dureza da função. Nenhum mecanismo de proteção os isentou de chorar por Santa Maria e por tudo o que a soma de vítimas naquele ginásio representava: mais de 9 mil anos potenciais de vida perdidos, considerando a expectativa dos brasileiros de 75 anos. Não havia como ficar imune ao sofrimento provocado pela tragédia. Naquele domingo, a cidade inteira tinha seu coração preso dentro de um ginásio.
Embora estivesse sem o filho havia poucas horas, a saudade que sentia não cabia em lugar nenhum, muito menos dentro dela.
Dentro do Hospital, apesar de ninguém ter apertado o gatilho, todos carregam mortes nas costas.
[sobre o Hospital Colônia de Barbacena]
Fazer silêncio diante de uma nação que foi esfacelada pela violência no passado e continua reproduzindo seus métodos de tortura e exclusão do período do arbítrio é compactuar com crimes dos quais podemos nos tornar vítimas. Pior que isso: reeditar nas ruas do país marchas pela ordem clamando o retorno da ditadura é desconhecer os anos de sombra que envolveram o Brasil.