Clarissa Macedo
AQUELA QUE NÃO QUIS SER...
Nunca a mulher eleita
a mãe, a caseira. Jamais
a primogênita aceita.
Nunca a preferida assumida
ou a bela primeira legitimada.
Sempre a repartida, a preterida.
Dentre todas inteiras, a fragmentada.
Nela só a astúcia cruel,
molemente enraizada.
Só que a vida deu de adoecer
nela se putrefar
deu de sucumbir, se escrever
desabrochar
e desabafando,
a jogou bem no meio do mar.
O INOMINÁVEL
Semente de horas invisíveis
Saudade aflita do que não vivi –
navio de desejos enrugados.
Morada no cume do monte ensolarado
tempestade muda que desaba.
E lá, bem dentro do coração,
desespero de intensa toada,
aquele vazio.
Não é fácil sentir os pelos na pele
contar as horas em que apenas sonho
e ver sentada o infinito cínico doído:
aquilo que não tem nome.
FACES
Lúrida é esta vida
que de triste anda esquecida
à agulha violenta do tempo;
sempre o segredo, o erro,
e de dor, angústia e medo
vai deixando-se matar.
Pálida, de sozinha gozar
o azul pleno e escondido,
escurecida é, pela sanha
soturna do esquecimento;
ah, se a lira inviolável
que ama o cosmo
iluminasse, perdida,
meu colo imponderável
o bafo da sombra final
não seria, digamos assim,
tão certo, tão ácido.