Clarissa M. Lamega
"Como explicar a atração gravitacional que a sua presença exerce sobre o meu corpo, garoto? Diz a lei que apenas os planetas possuem um poder tão grande, mas eu duvido. Quando você chega perto de mim é quase impossível segurar minhas pernas no lugar, que tremem ansiosamente para caminhar na sua direção. Mas não é só a física que não funciona bem por aqui. A matemática falha e erra tantas vezes, porque se somarmos um mais um (eu mais você) o resultado sempre acaba em um. Então eu apago, tento novamente, e a resposta se repete e me confunde ainda mais. Nossa soma, mesmo tão imperfeita nas regras do mundo, nas minhas contas resulta em certeza absoluta. Amor absoluto.
E o tempo, então? Ahh, o tempo. Quem foi que disse para o Cazuza que o tempo não pára? Eu sinto parar, e eu sei que pára. O tempo pára quando eu sinto o seu cheiro em qualquer canto na rua, quando você me aperta forte nos seus braços. Tudo pára quando você me diz com o olhar tão sereno o quanto me ama, e que não consegue ficar longe de mim. Os segundos são paralisados quando meu celular toca e eu penso que é você, ou quando escuto sua voz baixinha no pé do meu ouvido. O tempo pára toda vez que você pega minha mão, quando te sinto perto mesmo estando longe. O mundo todo pára quando você me envolve e respira forte na minha nuca, e quando você me aconchega no seu ombro. Os segundos voam no meio das nossas risadas, e seguem lentos longe da sua presença."
"Quero te expelir de mim. Quero te jogar no mundo, te vomitar todo sem ficar com nenhuma parte sua aqui dentro. Quero que você vá embora agora, quero que você saia por essa porta. Porque agora eu já me abasteci dos teus charmes e erros e do cheiro de shampoo no seu cabelo, e já passei a mão na sua nuca, já beijei com verocidade sua boca repleta de mentiras e desapegos, já te engoli inteiro dentro de mim. Te cheirei profundamente como se conseguisse me drogar do seu perfume, te mordi em pedacinhos e te arranquei sorrisos que derretiam meus ouvidos. Te peguei, te possuí, me abasteci, me preenchi por todos os cantos de você e te enchi dos meus mais suculentos ardores. Me droguei de você.
Mas vá embora agora, porque te sinto pulsando em todas as partes do meu corpo e acho que estou ficando maluca. Seu efeito em mim é muito mais do que alucinógeno e realmente me faz passar mal. Me deixa com o gosto dos seus beijos mal resolvidos querendo se apagar dos meus lábios, confunde meus sentidos e me deixa tonta, me faz querer te jogar pra fora de mim. Minha abstinência já passou, pode ir embora agora. Mas peço ferozmente, como quem gosta de brincar com fogo, outra dose de você mais tarde."
"Mas meu trem tem pressa, passa de estação em estação e não se cansa de correr. Quando ameaça marcar fundo demais, causar qualquer indício de futura dor ou intensidade na minha vida, apelo logo para a saída de emergência, get out, sem dar trela nem chance de algo bonito vir a acontecer."
"Lembrei do dia em que chamei seu irmão de "docinho" no telefone, pensando que era você, e da vez que gritei com você pelo telefone e logo depois bati à porta da sua casa com o urso que você me deu debaixo do braço e chinelos, pedindo para dormir com você. Assisti o filme que vimos no cinema no nosso primeiro encontro, vesti seus chinelos tamanho 42 por um dia inteiro, tirei sua blusa (que você esqueceu comigo) do guarda-roupa e deixei seus cheiro se misturar com o meu. Chorei um pouco lembrando do último beijo e da última vez que passeamos de mãos dadas, das brigas intermináveis e da última palavra. Chorei lembrando que fiquei com o telefone no ouvido escutando o "tu tu tu" depois de você ter desligado. Passei na frente da sua casa, fiquei parada um pouco vendo as luzes dos cômodos se acenderem e se apagarem, fui embora. Lembrei de quando você me aninhou na rede, lá na praia, e cuidou de mim quando eu me gripei e fiquei de cama. Comprei o sabor de sorvete que você gosta e comi sozinha assistindo um filme deprê. Li umas revistas que você achava a maior bobagem do mundo, escutei a "nossa música" no repeat do rádio. E sabe de uma coisa? Nada que eu faça vai diminuir a dor da perda, então quero mais é sentir cada milímetro de você dentro de mim. Dói sim, é difícil sim. Mas te lembro e te curto em cada detalhe do que ficou: desde uma meia embaixo da cama até uma frase sua cochichada no pé do ouvido. Sinto você perto de mim todos os dias, e sei que foi bom o que passou. Mesmo longe, pensa em mim também, tá?"
"Somos complexos, difusos, amantes desconfiados. Estamos em um jogo de pôquer, aonde o disfarce é o que decide a partida. Saiba esconder tuas verdadeiras cartas e sairá vencedor - é o que dizemos a nós mesmos. Mas o amor, esse não é um jogo de mentiras. Os dois lados perdem. Difícil é fazer entender a mim e a ti o que só o tempo mostra: a verdade, por mais que doa, é quem reina. A verdade machuca, rala, faz ferida, mas cicatriza. E deixa experiência, compaixão e até mesmo o perdão. Eu minto que não quero te ver, não hoje, não agora, e corro pro banheiro derramar litros de lágrimas. Você prova de outras bocas que não sejam da minha, e finge a maior felicidade do mundo. Jogamos palavras falsas no ar, discutimos quem é o certo e quem é o errado, sabendo que não existe nem um e nem o outro."
"Sei a maneira como você se senta e como age quando está nervoso, sei das tuas caras e das suas máscaras. Sei como você é de verdade, longe dos amigos machões e de toda a pose imposta a você. Sei que quando estou perto de você, você gosta de sentir o cheiro do meu cabelo, de leve, mas finge que não. Eu pego suas fotos e te sinto profundamente em mim, te escondo como criança debaixo dos lençóis pra ninguém ver o tamanho do meu amor. Amasso, dobro, aperto meu amor pra ele caber em uma caixinha minúscula, sendo que ele poderia ocupar o espaço do planeta inteiro. Quero que ele seja menos amor, que seja menor e mais desprezível do que realmente é. Quero colocar ele embaixo da cama e fingir que não existe, jamais te deixar vê-lo."
"Queria poder chegar bem perto de você, e olhando bem fundo nos seus olhos estonteantes, questionar quase silabicamente: "vo-cê-me-a-ma?". Pois eu te amo. Sem mentiras, desta vez. Sem máscaras. Um príncipe de mentira, com castelos de mentira, a gente consegue suportar na boa. Mas uma história de mentira, um amor construído por palavras e jogos sujos de mentira, não."
"Minhas palavras machucam, são cuspidas para as pessoas todas do mundo, são jogadas sem medo, como se eu fosse um dragão ou qualquer outro ser que precisa ferir para viver. Nem ao menos faço de propósito: te juro que seguro ao máximo minhas frases e palavras plenas de sentimentos misturados, mas elas me queimam inteira por dentro, e preciso jogá-las para fora de mim. Ferem a mim, aos outros e a ti. Sou um dragão, bicho feroz por natureza, sem intenção de machucar porém incumbido de fazê-lo.Meu fogo arde e queima, e já se tornou comum ferir. Meus defeitos me fazem inteira, plena, e ao mesmo tempo me destroem. Sou bicho arisco, toque com cuidado, me segure da maneira certa."
"Não acordo cedo, então não me peça para acordar com meus olhos te vigiando. Eu sei, é romântico e gostoso, talvez vez ou outra eu te surpreenda assim. Demoro para levantar da cama, me espreguiço e continuo deitada por um bom tempo ainda. Cozinho bem, mas em raras ocasiões tenho vontade de preparar um jantar especial. Fico de pijama até depois do almoço, normalmente, uso minhas pantufas cor-de-rosa com lacinhos sem pudor algum. Não espere uma reação imediata minha: tenho o desastroso defeito de demorar a analisar o que sinto. Penso, repenso, toco, viro, abro, especulo por dias para resumir em gosto ou não. Não me peça pra apressar meu tempo, apenas let it be, deixa ser. Tenho a maior calma do mundo, porém não me intimide errando várias vezes no mesmo ponto - finjo que não, mas sofro calada e acumulo tudo por dentro. Tenho medo de acumular minhas fraquezas e jogá-las em você, então apenas me abrace forte pra eu me recuperar e me acalmar no cheiro da sua nuca. Decodifico expressões, mãos e olhos e muitas vezes dou suposições ciumentas e erradas, te julgo mal por pensamentos que me enlouquecem. Meu ciúme pula na cabeça e amarra minhas mãos, me deixa brava e chorona. Cuspo palavras, firo, e me arrependo em seguida. Perdôo facilmente, mas não pense que esquecerei. Tenho um coração gigante, aonde o ar que circula é puro amor, mas que não se entra tão fácil. Tenho receio da entrega, do presente, mas se você persistir, conhecerá o meu mais íntimo."
"Cuidado aonde toca, nao quebre nada, nenhum elo ou confiança, entre com sutileza. Tenho medo do que desconheço, mas a partir do momento em que te deixo abrir o portão, girar a maçaneta da porta, me dou de corpo, alma, coração. Agüente firme, no começo parecerá uma enchurrada de sentimentos, coisas bonitas e outras nem tanto, sede e querer mais, mas logo acostuma. Tenho pavor, e ao mesmo tempo essa fome insaciável de amor, de bem-querer. Entrego minha confiança total, mas ela também é retirada facilmente. Não sei mentir, muito menos para agradar. Não te confiarei nada que eu pense que você não suportará. Não sou muito tolerante, cometo erros por medo, e às vezes fujo também. Corro para longe e ataco com minhas sujeiras e palavras de fogo."
"É difícil se equilibrar quando o medo de cair toma conta. Quem sabe, nem rede de segurança me aguarda lá embaixo. Concentro todas as minhas forças em continuar, lentamente caminho na corda que balança sob meus delicados pés - que ainda possuem tantos passos a dar, em tantos lugares diferentes. Surgem imensos problemas durante o percurso, aliás este que visto de fora parece tão curto e simples. Mas ser bailarina e topar com estes problemas não é mole, não: faz tremer as pernas, querer largar aquela vara e voltar correndo para quando não existia nada daquilo. Respiro fundo, então, ajeito a saia, recomeço com calma e cabeça erguida, avanço."
"Tudo ao redor virou câmera lenta, o sol da tarde brilhando entre as folhas das árvores, e um cara de pé que olha nos meus olhos e me deixa sem reação. Primeiro que, só pra te avisar, sou eu quem faz esse lance de olhar fundo nos olhos, então senti minha arma virada contra mim."
"Caí na rede, entrei numa magia momentânea gostosa e jamais experimentada. Senti um arrepio atravessando o corpo quando seus olhos azuis claríssimos apontaram para os meus. Me lembrou uma piscina, com a água quase transparente. Parecia que sua menina dos olhos era o ralo da piscina, sugando meus pensamentos, minhas ações e me deixando sem rumo."
"Minha vontade era de mergulhar com unhas e dentes nos seus olhos de águas azul-claro, ondas pequeninas, e ficar morando por lá. Me inquietava, e ao mesmo tempo transmitia uma paz surreal."
"Saí de lá e sentei em um banco, com a sensação de que havia aspirado o máximo de ti, e deixado também o máximo de mim."
"Preciso te dizer que gosto de intensidade, do que mete medo em muitos e encoraja outros. Gosto do desafio. E isto não me faz insensível, é justamente o contrário: sinto cada palavra, cada gesto cutucando bem dentro da alma, do corpo. Foi de tanto sentir que pedi mais; mais do que me faz viva, quero mais do que pode machucar mas dá aquele prazer gostoso de ter se tornado completo."
Tenho tanto para dar que às vezes até me perco nessa bagunça emocional. Destino tudo a você, de alguma forma incompreensível e irracional, é assim. Não tem atraso, maneira correta, desculpa boba: somente é você. E olha, se eu estou aqui parada é porque também não entendo. Se fico horas do meu dia a te espiar por aí, se te mando recados telepaticamente botando fé que em algum lugar da sua mente (ou coração) você irá entender e receber meu chamado, é porque eu também não sei. Se quero que você sinta da maneira como eu sinto, que você veja que não é culpa minha - e sim desse aperto que envolve meu coração e remexe insistentemente afim de alguma reação - é porque nem eu estou me entendendo.
"Quero tanto esbarrar com você em alguma esquina qualquer das milhares de ruas dessa cidade, te contar o que se passa e como as coisas podem ser. Mas me calo, enquanto o coração manda dizer que eu te amo. Seguro meu coração desesperado, dobro, guardo no bolso, e tento agir com a pouca sanidade que ainda me resta."
"Chego em casa e desabo todas as mágoas entre meus lençóis, e peço para que seja, que seja como o coração manda dessa vez. Que eu obedeça, que eu siga, que eu me permita sentir e te faça sentir também. Por isso estou aqui, parada diante da porta da sua casa implorando por mais do que somente migalhas. Migalhas não me satisfazem, te explico, quero o tudo ou o nada. Sentir dor faz parte, e faz agir instantaneamente. Dessa vez, sem segurar os anseios, digo tudo o que preciso, o alarme interno apita em sinal de saída de emergência mais eu continuo aqui, persisto. Te explico humildemente, secretamente, que a culpa não é minha, e sim da tal intensidade que me deixa em alerta vermelho perto de ti. Te peço amor, entrego todo o que eu puder e invento mais um pouco para te fazer feliz. A única condição - se é que ainda posso exigir estando na porta da sua casa implorando por carinho - é aceitar minha vulnerabilidade diante do sentir. Sinto profundamente, deixo cutucar, sangrar. Me expulse para sempre, ou me deixe ficar e ofereça amor fresco com gosto de cama quentinha e beijo de bom dia. Peço baixinho para somente Deus (e você, do meu modo telepático de agir) escute: que aceite, por favor, que diga sim. Que abra a porta."
"Então eu te mando embora, e você vai. Mesmo vendo você correr para longe, o aperto continua, e eu desejo que você não me obedeça mais, que você fique e espere e abrace e aceite meu choro de menina acostumada com facilidades. Não quero ser embalada pela dor, então que você me embale essa noite.
Me faça uma supresa, quem sabe amanhã. Bata à minha porta. Eu preciso tanto que você venha, que entre sem pedir, que me faça entender que é assim. Tenho medo da dor, mas ignore meu pedido para você ir embora. Só diga bem alto que fica - hoje, sempre - e repita várias vezes. Me tome nos braços, me dê um susto mostrando que você vai ficar, não importa o que aconteça, e me faça acreditar."
"Eu preciso ter certeza que você vai atolar esse vazio de coisas boas, trazer todas as suas coisas e móveis e adaptar meu coração para morar dentro dele."
"Me beije, tire esse susto, passe toda a sua saudade através dos seus lábios, e me diga que quer ficar. Mas não me peça permissão, pois não sei a hora certa de mandar em mim, e chega de doer! Apareça com sua bagagem e fique, tem espaço no coração."
"Você se abastece de mim até o tanque encher, e some para dar suas voltas pelo mundo. Eu, tola, com todo o carinho do mundo te abasteço, te deixo deitar no meu colo e te dou agrado, amor, palavras doces. Você, sem motivo ou explicação, vai embora e leva os pedaços de mim junto com você. Eu fico, ao mesmo tempo, como se fosse brincadeira, sem você e sem mim. Uma tremenda sacanagem, não acha?"
"Pare de me levar com você, eu te imploro. Como se já não fosse suficiente eu te implorar e me jogar aos seus pés para você ficar, te peço ao mínimo pra você me deixar quando for."