Alva Ningal
O AMOR FAZ O HORÁRIO.
Se tudo correr bem, a vida é longa.
Ou curta, dependendo da perspectiva.
O tempo é uma invenção humana.
O tempo é uma psicologia.
O tempo é relativo.
Mas, em simultâneo, o tempo tem a objectividade do relógio, do calendário e do horário.
Mas porque a vida é finita, inventámos medidas temporais pelos astros.
Um dia é o tempo que o sol demora a dar uma volta completa à Terra.
Uma manhã é o tempo em que o sol se levanta até ao seu ponto mais alto no céu.
Uma tarde é o tempo desde o ponto mais alto do sol até que este se põe.
Etc.
Mas o tempo de cada dia está sugado até ao tutano.
As pessoas estão hiper-ocupadas mas são implicáveis à hora de dar tempo umas às outras.
Um e-mail tem de ser imediatamente respondido.
O sinalzinho de ‘‘mensagem lida’’ obrigada à resposta instantânea.
As pessoas encaram os dias numa perspectiva ‘‘de ontem para hoje’’.
As pessoas querem-se umas às outras já, da mesma forma que desejam pizza às onze da noite e a Glovo traz a casa, ou que vão a um site, clicam em Buy Now e está. As pessoas tratam-se como comodidades. As relações humanas estão contaminadas pelo tédio e pela coisificação. Um telemóvel desligado é insuportável, motivo para terminar uma relação. Ninguém se lembra dos milhões de compromissos que se mantiveram por carta, dos milhões de anos em que, sem telemóvel, as pessoas não deixaram de se relacionar romanticamente. Não gosto das regras tácitas do presente porque, ao evidenciar uma visão superficial do tempo, as pessoas revelam uma experiência superficial das emoções. E só apetece construir com alguém que consegue ver the big picture. Eu preciso de ter tempo para mim e para as minhas coisas. Ao meu lado, não preciso de alguém que faz as contas mesquinhas às 24h do dia, mas de alguém que está nisto a antever uma vida de acompanhamento mútuo.