Alex Castro
Poucos conselhos são mais canalhas do que o clássico “seja você mesmo”. A maioria dos problemas do mundo veio de gente que estava simplesmente sendo si próprio. Mais importante do que “ser você mesmo” é ser quem você quer ser. Todas as forças do universo nos impelem a nos conformarmos, a aceitarmos as regras do mundo, a cedermos, nos moldarmos. Ser a pessoa que você quer ser é uma das tarefas mais difíceis do mundo. É uma luta diária, surda, interna, contra seus próprios preconceitos, suas mesquinharias, seus egoísmos.
Quer ser menos invejoso, menos ciumento, menos egoísta? Então, seja.
Exercitamos o abdômen e exercitamos a memória. Por que não exercitar a empatia? De um modo ou de outro, julgamos as outras pessoas por suas ações, mas queremos ser julgadas por nossas intenções. ma maneira de quebrar esse nosso narcisismo egocêntrico é tentar olhar para as outras pessoas com a mesma generosidade com a qual olhamos para nós mesmas.
Resista com todo afinco à ânsia de julgar. O bico do sapato dele está gasto? Não, não é porque ele é relaxado ou desleixado ou pobre ou mulambento, etc etc. Abrace a enormidade do fato de que você simplesmente não sabe, e provavelmente jamais saberá, porque o bico do sapato dele está gasto.
Todas as pessoas desejam ser ouvidas. Entretanto, tão poucas escutam.
Por que é tão difícil suspendermos nossos julgamentos, nossas opiniões, nossas interrupções, para conceder a outra pessoa o inestimável dom da nossa atenção completa e concentrada?
Nossa atenção plena é um dos maiores presentes que temos pra oferecer.
Não pense em você, no que vai retrucar, no que teria feito no lugar dela, no que acha que ela deveria ter feito, naquela coisa parecida que aconteceu com um amigo seu. Nada disso importa.
Você não existe. Não existe seu ego, suas opiniões, seus julgamentos de valor. Você está só.... ouvindo! Todo o seu ser está concentrado nessa única dificílima atividade transcendental. Ouvir.
Em nossa sociedade narcisista, onde somos criados para achar que o mundo gira à nossa volta, tendemos a dar um valor excessivo a nossas próprias opiniões. (Afinal, são opiniões dessa pessoa tão incrível: eu!)
Pior, achamos não só que temos um direito divino de ter opinião sobre tudo, como também de expressar essa sabedoria a todo momento, e, mais ainda, que é um favor que fazemos às pobres mortais dizer a elas o que pensamos sobre suas vidas.
Mas essa constante e infindável salva de opiniões que atiramos umas contra as outras é uma violência, é uma intrusão, é puro egocentrismo.
As pessoas amigas e familiares querem saber quando vai finalmente largar o teatro, parar de se vestir assim, fazer faculdade, defender a tese, prestar concurso, prestar um concurso que ganhe mais, arrumar um emprego, largar esse emprego, arrumar namorado/a, casar com namorada/o, comprar um imóvel, comprar um imóvel maior, comprar um carro, comprar um carro melhor, virar hétero, abraçar a monogamia, encontrar Jesus, tomar jeito, etc.
A lista é tão infinita quanto são infinitos os comportamentos das pessoas.
Todos esses comentários são violentos. Todos eles são pequenos espinhaços diários que cravamos justamente nas pessoas mais próximas a nós.
Por que fazemos isso? Por que nos damos ao direito de ter opinião sobre questões tão pessoais das vidas de outras pessoas?
A velhinha que encontramos na fila do banco raramente invade nossas vidas.
A violência constante e contínua dos comentários invasivos é exclusivamente perpetrada pelas pessoas mais próximas a nós. Justo aquelas que deveriam nos amar e nos respeitar, e não nos oprimir com sua avalanche de opiniões não-solicitadas.
Reconhecer o direito das outras pessoas de viverem livres da opressão de nossas opiniões também é uma maneira de exercitar a empatia.
Não é verdade que devemos tratar as pessoas com gostaríamos de ser tratadas.
Porque a outra pessoa é uma outra pessoa. Porque ela teve outra vida, outras experiências. Porque ela tem outros traumas, outras necessidades.
Basicamente, porque ela não sou eu. Porque eu não sou, nem nunca vou ser, nem devo ser, a medida das coisas.
Utilizar a mim mesmo, minhas vontades e necessidades, o jeito que quero ser tratado, como se eu fosse o parâmetro para todas as outras pessoas é a essência do narcisismo e do egocentrismo. É o exato oposto de empatia.
a vida de cada pessoa inclui um horizonte de acontecimentos que se estende perpetuamente além de nossa visão:
Estou exausto. Não sei o que pensar. Não tenho mais opinião. As pessoas e veículos cuja opinião eu utilizava para me balizar estão mais confusas que eu. Parece que estamos em um daqueles momentos históricos onde ninguém, nem os atores principais, sabe o que está acontecendo. Ninguém tem nenhum plano a longo prazo, nenhum projeto estratégico, a não ser sobreviver a todo custo.
Considerando o tempo que passamos existindo e o tempo que passamos não-existindo, nosso estado natural é a não-existência. Existir seria apenas um breve soluço, um glitch, um bug, dentro de uma perfeita, plena e eterna condição de não-existir.
Se uma pessoa não pediu minha opinião, é muito provável que ela não queira saber. Se pediu, é muito provável que tenha sido por polidez. Quase ninguém quer saber nossa opinião. Nem nós mesmas deveríamos estar assim tão interessadas em nossas próprias opiniões.