Alejandra Pizarnik
Não sei sobre pássaros,
não conheço a história do fogo.
Mas creio que minha solidão deveria ter asas.
VOZ MENDIGA
E ainda me atrevo a amar
o som da luz numa hora morta,
a cor do tempo num muro abandonado.
Em meu olhar o perdi todo.
É tão distante pedir. Tão perto saber que não há.
Se te atreveres a desvendar
a verdade desta velha parede;
suas fissuras, suas ranhuras,
formando semblantes, esfinges,
mãos, clepsidras,
seguramente te haverá de surgir
uma figura para acalmar a sede,
provavelmente se haverá de ir
esta ausência que te bebe.
só a sede
o silêncio
nenhum encontro
cuidado comigo amor meu
cuidado com a silenciosa no deserto
com a viajante com o copo vazio
e com a sombra de sua sombra
Quando me olhas
meus olhos são chaves,
o muro tem segredos,
meu temor palavras, poemas.
Só tu fazes de minha memória
uma viajante fascinada,
um fogo incessante
FESTA
Eu desdobrei minha orfandade
sobre a mesa, como um mapa.
Desenhei o itinerário
para meu lugar ao vento.
Os que chegam não me encontram.
Os que espero não existem.
E bebi licores furiosos
para transmutar os rostos
em um anjo, em copos vazios.