Adriano Vox
Uma poesia
Nada seria na escuridão se
Sensível não tocasse um coração
Nem arrepiasse a pele da humanidade.
Para que fingir, então, quando
O poema não é valorizado,
Contemplado nas esquinas
Ou nas grandes reuniões?
O poeta é uma caneta,
Uma caneta no papel,
Observa, reflete e constrói versos:
Modula a vida, modula o céu.
Por que ler ‘Em alguma parte alguma’
Se existe alegoria, ideologia e fantasia?
É que é apenas Gullar,
E sua magnífica poesia.
A palavra é temática da vida,
Dos temas quase impercebíveis.
Ora expressada, ora escondida,
Às vezes suave, às vezes fatal.
A poesia soa como delicadeza,
Aberta ao mundo das letras vigentes,
Como pura magia do sorriso de criança
Ou da mais sublime estrela cadente.
Da poesia ecoa-se toda esperança
Do eco ainda não difundido ou interpretado,
Da mais intensa inspiração perdida
Nas pautas da vida ou nos traços do fado.
Minha poesia é o
Meu mundo.
O mundo é injusto.
Por isso, digo:
Acabou-se a inspiração.
Meus melhores poemas
Estão de castigo.
Distantes.
Mas ainda lembro,
Atônito,
Que os ouvia conversando
Sobre ter adiantado um vale
Para pagar o mercado
Da mulher e filha,
Sobre ser feliz e
Brindar cada dia
Os amigos...
E era disso que eu queria
Ter tecido minha poesia,
Que se foi
E não volta mais,
Pois cada momento é
Único.
Poesia é assim,
Nasce porque tem que nascer:
Inspirada, espantada, revoltada,
Questiona nosso prazer
Absoluto,
O nosso redor oculto,
Onde não existe, infelizmente,
A poesia,
Quem dera se existisse
A escutaria,
E punha-me a contemplá-la.