. Escrever é como de olhos fechados te... Cláudio de Andrade

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Escrever é como de olhos fechados te ver


É simples , ser das palavras o cimento
Pega-las , passando ao vento
Unir as frases , formar pensamento
É difícil escrever sem sentimento

Se pegar um argumento
que tenha paixão
saudade ou lamento
Alegria ou desilusão
É este o fermento
Escrever com emoção

Desejo , rima com beijo
com murmuro , com conjuro
pele soa bem com com zele
mel rima com céu


Uma ode à mulher amada
Ou à amada namorada
Um acalanto
Que sufoque seu pranto

O toque suave na pele
um sussuro que seu sono vele
O mão e o cabelo
O corpo dela em pêlo

Talvez escrever um soneto
Com dois quartetos
E dois tercetos
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Falando na natureza
De sua beleza
Procedência divina com certeza
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Da água que desce a serra
Irrigando a terra
Que gritando por socorro , berra

Ou um soneto estrambótico
Estruturamente caótico
Como fazia Cervantes
Poeta de terras distantes

Posso até falar de Jesus
Vivo fora da Cruz
O dignatário da Luz
Que pela mão nos conduz

Escrever uma embolada
Quiçá uma toada
Para ser musicada , trazida por um menestrel
em ritmo de cordel

Ou como um trovador
Falar de amor
De conjunção carnal
Tudo vem junto no meu embornal

Mas ia falar de beijo
Me lembrei do café com pão de queijo
Já é hora de ir
O sol querendo surgir

Lava o rosto , olha no espelho
No céu o nascente já está ficando vermelho
Sente o ar entrar no seu peito , a água que te escorre do queixo
Seja a superficie do rio , e não o fundo , o seixo

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